Archivo Español de Arqueología 96
enero-diciembre 2023, e16
ISSN: 0066-6742, eISSN: 1988-3110, ISSN-L: 0066-6742
https://doi.org/10.3989/aespa.096.023.16

N O T I C I A R I O

Um suporte de época romana epigrafado e decorado com temática marcial em Viseu (Portugal)

A Roman inscribed support decorated with a martial theme in Viseu (Portugal)
Un soporte de época romana epigrafiado y decorado con temática marcial en Viseu (Portugal)

Armando Redentor

Universidade de Coimbra, Faculdade de Letras, Centro de Estudos Interdisciplinares CEIS20

https://orcid.org/0000-0002-6459-3285

Pedro C. Carvalho

Universidade de Coimbra, Faculdade de Letras, Centro de Estudos Interdisciplinares CEIS20

https://orcid.org/0000-0003-3749-3542

Pedro S. Carvalho

Eon, Indústrias Criativas, Lda

https://orcid.org/0009-0000-5954-959X

Maria de Fátima Beja e Costa

Eon, Indústrias Criativas, Lda

https://orcid.org/0009-0007-5189-9799

RESUMO

O presente texto tem como propósito central a apresentação de um achado epigráfico realizado na cidade de Viseu (Portugal), que, na Antiguidade, foi uma das capitais de ciuitas do Norte da Lusitânia. A peça em questão é uma estela que se encontrava em reaproveitamento no edificado contemporâneo. Destaca-se, do ponto de vista plástico, pela figuração (incompleta) de um guerreiro, mas também pelas particularidades linguísticas do sucinto texto que apresenta. Discutem-se ambos os aspetos, bem como a integração da estela no contexto cidade romana.

Palavras-chave: 
epigrafia; estela; multilinguismo; onomástica; *Vissaium; Lusitania.
ABSTRACT

The present text centres on an epigraphic find in Viseu (Portugal), a city that was, in antiquity, one of the ciuitas capitals of northern Lusitania. The piece in question is a stele that was later reused in contemporary buildings. Its most striking aspects are the (incomplete) representation of a warrior and the linguistic peculiarities of its short text. Both aspects are discussed, as well as the historical and urban context of the stele in the Roman city of Viseu.

Keywords: 
epigraphy; stele; multilingualism; onomastic; *Vissaium; Lusitania.
RESUMEN

El objetivo principal de este texto es la presentación de un hallazgo epigráfico realizado en la ciudad de Viseu (Portugal) que, en la antigüedad, fue una de las capitales de ciuitas del norte de la Lusitania. La pieza en cuestión es una estela que se encontraba reutilizada en un edificio de época contemporánea y que destaca tanto por su decoración, al incluir la representación (incompleta) de un guerrero, como por las peculiaridades lingüísticas del sucinto texto que muestra. Se analizan ambos aspectos al igual que la integración de la estela en el contexto de la ciudad de Viseu.

Palabras clave: 
epigrafía; estela; multilingüismo; onomástica; *Vissaium; Lusitania.

Enviado: 12-08-2023. Aceptado: 08-11-2023. Publicado online: 18-12-2023

Cómo citar este artículo / Citation: Redentor, A., Carvalho, P. C., Carvalho, P. S. y Costa, M. F. B. (2023). “Um suporte de época romana epigrafado e decorado com temática marcial em Viseu (Portugal)”. Archivo Español de Arqueología, 96, e16. DOI: https://doi.org/10.3989/aespa.096.023.16

1. INTRODUÇÃO

 

O presente texto revela uma interessante descoberta epigráfica de época romana realizada no centro histórico da cidade de Viseu, cuja ocupação antiga vem sendo progressivamente revelada pelo cúmulo de intervenções arqueológicas em contexto urbano, não havendo hoje dúvida de que terá sido, então, capital de ciuitas (Vaz e Carvalho, 2009Vaz, J. L. I. e Carvalho, P. S. (2009). “Viseu, a construção de um espaço urbano: do castro proto-histórico à cidade romana”. Em: Cruz, J. (Coord.). Viseu: cidade de Afonso Henriques. Viseu: AVIS, pp. 31-46.; Carvalho, Carvalho e Perpétuo, 2020Carvalho, P. S. e Costa, F. (2020). Trabalhos Arqueológicos (sondagens de diagnóstico arqueológico e acompanhamento arqueológico à picagem e/ou demolição de paramentos) no edifício situado no Gaveto Sr.ª da Boa Morte n.º 19/21 - Rua das Ameias nº 35/39, Viseu. Relatório policopiado., 2022Carvalho, P. C., Carvalho, P. S. e Perpétuo, J. (2022). “Vissaium, a cidade lusitana redescoberta”. Em: Nogales Basarrate, T. (Ed.). Ciudades Romanas de Hispania II / Cities of Roman Hispania II. Hispania Antigua, Serie Arqueológica, 14. Roma e Bristol: Museo Nacional de Arte Romano e L’erma di Bretschneider, pp. 393-412.).

O achado em causa ocorreu na sequência dos trabalhos arqueológicos efetuados, em 2016, pela Eon, Indústrias Criativas, Lda. no edifício correspondente ao nº 149 da rua Direita, sede do antigo Orfeão viseense (Costa, 2016Costa, F. (2016). Trabalhos arqueológicos (sondagens de diagnóstico arqueológico) no edifício da Rua Direita nº 149 (Antigo Orfeão), Santa Maria, Viseu. Relatório policopiado.). Sito na União de freguesias de Viseu (Santa Maria), o imóvel apresenta a fachada principal voltada para a referida rua e um logradouro, mais estreito, voltado para a rua de Nossa Senhora da Boa Morte (Fig. 1). A intervenção arqueológica realizou-se no âmbito de um projeto de reabilitação do imóvel promovido pelo Município, tendo implicado a demolição de algumas paredes existentes e a abertura de uma sondagem diagnóstico no logradouro, na qual o monumento apareceu. No entanto, a exumação da peça viria apenas a ocorrer em abril de 2021.

medium/medium-AESPA-96-e16-gf1.png
Figura 1.  Localização do achado na planta da cidade atual de Viseu (elaboração própria).

A origem do edifício do antigo Orfeão de Viseu encontra-se intimamente ligada à Sociedade de Recreio Protetora do Montepio Visiense, cuja fundação remonta aos finais do século XIX, tendo sido constituída a 20 de maio de 1894 (Portugal. Governo Civil do Distrito de Viseu, dc. PT/SGMAI/GCVIS/H-B/001/02133Portugal. Governo Civil do Distrito de Viseu (1894-1924). PT/SGMAI/GCVIS/H-B/001/02133: Sociedade de Recreio Protectora do Montepio Visiense, também designada de Sociedade de Recreio Protectora do Monte-Pio Viziense. Caixa 74 (cota original: K0718). Doc.). Não se conhece uma data precisa para a construção do imóvel. Contudo, as referências documentais indicam que a referida sociedade recreativa já se encontrava instalada na rua Direita, em 1901, e num espaço de áreas mais reduzidas do que as do atual. Em 1912, o Montepio viseense pretende enobrecer o imóvel e, para tal, solicita autorização ao Município para proceder à substituição da cal que revestia a fachada por azulejos, chegados até ao presente. Nesta época de maior fulgor financeiro registou-se também uma progressiva expansão para as vertentes norte e poente através da aquisição de uma “casa pertencente a Alfredo Borges Lopes” em 1913. Em 1921, a ampliação física da instituição teve continuidade quando se procedeu à compra de “um prédio urbano que confronta com o edifício em que está instalada esta associação pelo lado do norte”, segundo consta de ata de reunião extraordinária da Assembleia Geral da Sociedade de Recreio Protetora do Montepio Visiense, datada de 21 de outubro de 1921 (apudCosta, 2016Costa, F. (2016). Trabalhos arqueológicos (sondagens de diagnóstico arqueológico) no edifício da Rua Direita nº 149 (Antigo Orfeão), Santa Maria, Viseu. Relatório policopiado.).

Portanto, na sua origem, a nova sede da associação deve ter procedido à demolição das casas existentes para dar lugar, durante o período de 1901 a 1921, à construção de um imóvel novo que redefiniu espacialmente o lote e originou um novo enquadramento no bairro, vindo inclusivamente a alterar a frente da rua, uma vez que a fachada recua ligeiramente em relação ao edifício vizinho, de traça tardo-medieval, implantado a sul. Esta solução permitiu aumentar a cércea e imprimir verticalidade ao edifício, conferindo-lhe destaque no contexto urbanístico.

Não obstante, a 16 de Março de 1923, a Sociedade de Recreio Protetora do Montepio Visiense sofre um forte contratempo nas suas intenções, pois, durante a madrugada, um incêndio com início na copa e cozinha do imóvel, localizadas no lado voltado à rua da Senhora da Boa Morte, fez soar os alarmes na cidade. Os bombeiros depressa acorreram ao local, resolvendo com prontidão o fogo, evitando que este se propagasse, quer à sede do Montepio Visiense, quer às casas vizinhas, conforme noticiou a imprensa local, regional e nacional (v.g. Jornal da Beira, 16/03/1923, p. 2Jornal da Beira, propr. e dir. José d’Almeida. A. 1, n.º 1 (9 Jan. 1921). Viseu: Henrique Luis Ferreira.; Notícias de Viseu, 18/03/1923, p. 3Notícias de Viseu, A. 1, n.º 1 (5 Abr. 1919) a [a. 11 (10 ago. 1929)]. Viseu.; O Comércio do Porto, 17/03/1923, p. 5 e 18/03/1923, p. 12Comércio do Porto, O. A. 3, nº 1 (2 jan. 1856) - [a. 152, nº 59 (30 jul. 2005)]. Porto: Typ. do Commercio.). Foi precisamente nas ruínas deste novo corpo destruído pelo incêndio que surgiu o monumento epigráfico alvo deste texto, encontrado, em reaproveitamento, encastrado no embasamento de muro de um dos compartimentos (Fig. 2), com disposição horizontalizada e a face lavrada voltada para baixo (Fig. 3).

medium/medium-AESPA-96-e16-gf2.png
Figura 2.  Sondagem de diagnóstico no logradouro com localização do local do reaproveitamento da estela (foto Pedro S. Carvalho).
medium/medium-AESPA-96-e16-gf3.png
Figura 3.  Registo do reaproveitamento da estela no embasamento de muro (foto Pedro S. Carvalho).

2. O SUPORTE

 

O suporte, apesar de incompleto, tanto na parte superior como na inferior, revela-se, do ponto de vista morfológico, correspondente a uma estela. As dimensões máximas são as seguintes: [99] × 43 × 19/20 cm. Há uma variação ligeira ao nível da espessura, apresentando, no lado direito, mais 1 cm que no oposto. Considerando as medidas apuradas, seria um suporte proeminente, podendo a altura total ultrapassar o dobro da conservada (Figs. 4 e 5).

medium/medium-AESPA-96-e16-gf4.png
Figura 4.  Face anterior da estela (foto José Alfredo/National Geographic).
medium/medium-AESPA-96-e16-gf5.png
Figura 5.  Modelo fotogramétrico da estela: vistas anterior (1), lateral direita (2), posterior (3), lateral esquerda (4), superior (5) e inferior (6) (MRM Hugo Pires).

Duas fraturas rampantes, com orientações opostas, marcam a amputação da parte superior, implicando a perda do início de um registo iconográfico singular que aponta para uma representação de guerreiro, conforme indicia a figuração de um amplo escudo redondo sobrepujado pela parte terminal dos membros superiores, um deles associado a uma arma branca, na face anterior. As representações do escudo, ao qual subjaz uma cartela retangular correspondente ao campo epigráfico, e dos membros superiores, com punhal na mão direita, articulam-se como se de dois registos distintos se tratasse, sem organicidade e com a rigidez também patente na própria execução. Os motivos encontram-se realizados com recurso ao relevo gravado, implicando a sua definição pelo rebaixamento da superfície ou plano original do suporte, que, acima da representação do escudo, se efetuou a toda a largura da face lavrada.

Imediatamente abaixo dos cortes que amputaram superiormente a estela, observa-se o final de antebraço e de uma mão esquerda espalmada como que pousada ligeiramente na diagonal sobre o peito, com o polegar levantado e os restantes dedos paralelos.

Do lado oposto, a representação da extremidade do braço, antebraço e mão direitos, em posição descendente. Encontram-se delineados desde o limite lateral esquerdo da estela até ao seu eixo de simetria, com a particularidade de a mão se mostrar fechada, com o polegar sobrelevado relativamente aos restantes dedos juntados entre si, segurando a empunhadura da arma da qual se apreciam o remate globular e a lâmina.

Abaixo, na superfície original desta face delineou-se, a toda a largura, um grande escudo circular cujo diâmetro ultrapassa a extensão da peça. Executou-se plano, definido por cordão perimetral em relevo gravado e por umbo central igualmente relevado e realçado por dois círculos concêntricos incisos, com um ponto no centro do menor. O seu perímetro invade, no eixo central, a área rebaixada que lhe está sobreposta e, no lado oposto, é tangente ao limite superior da cartela epigrafada.

O escudo redondo aponta para um modelo nativo, a caetra (De Hoz, 2006, pp. 122-124De Hoz, J. (2006). “Léxico paleohispánico referido al armamento y vestidura”. Palaeohispanica, 6, pp. 117-130.), tal como o punhal. EstrabãoEstrabão (2016). Geografia, Livro III: introdução, tradução do grego e notas de J. Deserto e S. H. M. Pereira. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra. alude, na sua Geografia (3. 3. 6), aos escudos dos Lusitanos, bem como ao uso dos punhais:

Diz-se que os Lusitanos são dados a emboscadas, à espionagem, que são vivos, ligeiros, bons em manobras. Têm um escudo pequeno de dois pés de diâmetro, côncavo na frente, preso [ao corpo] por correias, pois não tem manilhas nem outro tipo de pegas. Têm também um punhal ou um cutelo.

O geógrafo aponta para um modelo côncavo como os que se representam na estatuária de guerreiros lusitano-galaicos (Quesada Sanz, 2003, pp. 93-98Quesada Sanz, F. (2003). “¿Espejos de piedra?: las imágenes de armas en las estatuas de los guerreros llamados galaicos”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 87-112.).

Não querendo afirmar que a figuração deste suporte pretende ser pelo menos tão realista como as dos guerreiros lusitano-galaicos no que à morfologia respeita, será de referir que seria o escudo plano, nem côncavo nem convexo, o mais habitual na Península, nomeadamente no mundo ibérico e celtibérico (Quesada Sanz, 2003, p. 96Quesada Sanz, F. (2003). “¿Espejos de piedra?: las imágenes de armas en las estatuas de los guerreros llamados galaicos”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 87-112.). No exército romano, em tempos alto-imperiais, os escudos dos legionários têm formatos curvos, sejam retangulares ou ovais, ao passo que, entre as tropas auxiliares, são planos, com desenho retangular, oval ou hexagonal, sendo que apenas os porta-estandartes e alguns outros especialistas se equipavam com um pequeno escudo redondo preso no braço (Goldsworthy, 2003, pp. 129-130Goldsworthy, A. (2003). The Complete Roman Army. London: Thames and Hudson.; Bishop e Coulston, 2006, pp. 91-94Bishop, M. C. e Coulston, J. C. N. (2006). Roman Military Equipment: From the Punic Wars to the Fall of Rome. 2nd Edition. Oxford: Oxbow.).

A arma ofensiva representada é, como antes se referiu, um punhal, empunhado pela mão dextra. É também do lado direito das esculturas de guerreiros lusitano-galaicos que este tipo é representado, embainhado e integrante de um sistema de suspensão com correias. Não obstante, é impraticável enquadrá-lo tipologicamente, ainda que, tratando-se de arma nativa, seja plausível que represente um punhal de empunhadura biglobular como as que igualmente, com maior probabilidade, são representadas na referida estatuária de guerreiros (Quesada Sanz, 2003, pp. 103-104Quesada Sanz, F. (2003). “¿Espejos de piedra?: las imágenes de armas en las estatuas de los guerreros llamados galaicos”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 87-112.).

O facto de o motivo iconográfico se apresentar amputado diminui grandemente as possibilidades de realização de um enquadramento histórico-artístico deste tipo de manifestação plástica. As estelas antropomórficas e estátuas-menir do Norte peninsular atribuíveis ao Bronze Final, cuja distribuição abrange a região viseense, com relações em termos de grafismo com outros tipos, designadamente com as estelas com penteados e com as alentejanas, também incorporam armas como motivos iconográficos (Díaz-Guardamino, 2010, pp. 129 ss.Díaz-Guardamino Uribe, M. M. (2010). Las estelas decoradas en la Prehistoria de la Península Ibérica. Madrid: Universidad Complutense (tesis doctoral).), mas afiguram-se manifestações distantes da estela que nos ocupa, não só na técnica, mas sobretudo na organização iconográfica, tal como é manifesto o afastamento cronológico entre elas.

É também afastada cronologicamente das chamadas estátuas do Sudoeste, igualmente ditas de guerreiro, cuja distribuição alcança a Beira Interior e nas quais as armas são temática central - reproduzem uma panóplia básica que associa punhais/espadas, escudos/couraças (emblemas) e alabardas/lanças - às quais se tem atribuído um papel essencialmente comemorativo, onde cabe o contexto funerário, sendo, inclusive, os testemunhos conhecidos excêntricos à área viseense (Díaz-Guardamino, 2010, pp. 327 ss.Díaz-Guardamino Uribe, M. M. (2010). Las estelas decoradas en la Prehistoria de la Península Ibérica. Madrid: Universidad Complutense (tesis doctoral).).

A representação é claramente dissímil dos registos da estatuária de guerreiros lusitano-galaicos, cuja distribuição evidencia uma clara concentração na parte ocidental do quadrante noroeste da Península Ibérica, sobretudo na área meridional calaica, que, em época romana, corresponde ao território conventual bracaraugustano. Para além da diferenciação na técnica de execução, em que se está perante escultura em vulto redondo, destaca-se a posição estática destas figuras, com os braços colados ao corpo e o escudo, em posição frontal, seguro por correia ao pulso esquerdo, estando as mãos ocultas por ele. Os escudos surgem subdimensionados, sem ultrapassar a largura do corpo da figura representada, nomeadamente por razões técnicas associadas a constrangimentos do trabalho escultórico, tendo a sua superfície com umbo central e não raro côncava. As armas ofensivas encontram-se restringidas ao punhal e à espada, esta última apenas presente num reduzido número de exemplares. A presença do punhal é, pelo contrário, incontornável, mas é representado embainhado, suspenso do cinturão por duas correias que ligam à bainha do lado direito (Calo, 2003Calo Lourido, F. (2003). “Catálogo”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 6-32.; Schattner, 2003Schattner, Th. G. (2003). “Stilistische und formale Beobachtungen an den Kriegerstatuen”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 127-146.; Quesada Sanz, 2003Quesada Sanz, F. (2003). “¿Espejos de piedra?: las imágenes de armas en las estatuas de los guerreros llamados galaicos”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 87-112.; Redentor, 2019Redentor, A. (2019). “Os guerreiros lusitano-galaicos como representações de heróis”. Em: Schattner, Th. G. e Guerra, A. (Eds.). Das Antlitz der Götter: Götterbilder im Westen des Römischen Reiches / O rosto das divindades: imagens de divindades no ocidente do Império romano. Iberia Archaeologica, 20. Wiesbaden: Deutsches Archäologisches Institut e Reichert Verlag, pp. 133-149.). Todavia, há duas estátuas com gestos diferentes: na de Capeludos, Vila Pouca de Aguiar, Vila Real, (Calo, 2003, p. 8, nº 6Calo Lourido, F. (2003). “Catálogo”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 6-32.), um braço está dobrado em ângulo à frente do corpo, sem segurar o escudo; no guerreiro de Sabanle, Crecente, Pontevedra (Calo, 2003, pp. 17-19, nº 22Calo Lourido, F. (2003). “Catálogo”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 6-32.), também só uma das mãos segura o escudo, estando a outra, com os dedos abertos, sobre o peito, aspeto que é posto em paralelo com a estatuária celta do homem de Glauberg e do de Hirschlanden Glauberg (Schattner, 2003, p. 143Schattner, Th. G. (2003). “Stilistische und formale Beobachtungen an den Kriegerstatuen”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 127-146.). Mas também estes gestos são dissemelhantes do ostentado pela estela que nos ocupa.

As faces laterais desta encontram-se percorridas por dois sulcos longitudinais que definem rebordos simples, quer na parte anterior, quer na posterior, flanqueando as arestas com as faces que lhes são perpendiculares. Não sendo possível assegurar que os mesmos se estenderiam à cabeceira, poderão tão-só ter corrido ao longo da fração vertical de cada um dos lados. A face posterior encontra-se totalmente plana, indiciando um trabalho de acabamento aprimorado.

Este suporte afigura-se poder contar-se entre as estelas de cânone romano com retratos, de que há contados exemplos na Península Ibérica, com um ou mais personagens (cf. García-Gelabert e Blázquez Martínez, 1994García-Gelabert Pérez, M. P. e Blázquez Martínez, J. M. (1994). “Estelas funerarias con retratos”. Em: De la Casa Martínez, C. (Coord.). Actas del V Congreso Internacional de Estelas Funerarias, Soria, 28 de abril al 1 de mayo de 1993, vol. 1, pp. 309-322.) e onde, inclusive, se encontram representações de armas - veja-se a estela navarrense de Urbiola (HEp 7, 1997, 469) patenteando figura humana completa e lança com ponta para baixo -, ainda que nenhuma se aproxime do presente exemplar.

A epigrafia funerária esteleforme norte-lusitana do âmbito viseense aponta para tipos de cabeceira circular, triangular, estelas-altar e estelas antropomorfas - Tipos I.1 e 2, II.2, VI e VIII de Schlüter (1998)Schlüter, E. (1998). Hispanische Grabstelen der Kaiserzeit: Eine Studie zur Typologie, Ikonographie und Chronologi. Hamburger Beiträge zur Archäologie: Werkstadtreihe 2. Lüneburg: Camelion Verlag. - e, de acordo com os exemplares em que é possível fazer essa observação, a representação relevada da figura humana tanto surge em estelas com perfil simples, por exemplo de remate triangular, como nas estelas-altar. Especificamente da cidade de Viseu, é conhecida uma outra estela com figura humana (CIL II 5246), aparecida em edifício da antiga rua da Regueira, mas tem o seu topo incompleto: a figura feminina estante, representada de frente, mostra as mãos cruzadas sobre o peito.

A estela em estudo poderá, quiçá, enquadrar-se nalguma das tipologias referidas, apesar do lastro hispânico que da representação do armamento se desprende. Será interessante recordar, a este propósito, que são tipos que estão também presentes na capital provincial (Edmondson, 2006Edmondson, J. (2006). Granite funerary stelae from Augusta Emerita. Monografías emeritenses 9. Mérida: Ministerio de Cultura.) e que, num dos exemplares do primeiro (HEp 6, 1996, 118), há precisamente um motivo inciso composto por quatro círculos concêntricos que faz vagamente lembrar a configuração do escudo da presente estela, embora sem o requinte por esta exibido, distinguindo-se, desde logo, pelo largo espaçamento existente entre os dois círculos externos, sendo esse o único elemento ornamental patente na cabeceira e sobre um campo epigráfico moldurado, rebaixado e verticalizado.

Mas uma configuração claramente de escudo e com similitude à do exemplar viseense pode observar-se numa estela discoide de Clunia com motivo de cavaleiro lanceiro (Marco, 1978, p. 121, B10Marco Simón, F. (1978). Las estelas decoradas de los conventos Caesaraugustano y Cluniense. Zaragoza: Institución “Fernando El Catolico” e Diputación Provincial de Zaragoza.; ERClunia, pp. 19-20, pieza anepigrafa BDe Palol, P. e Vilella, J. (1987). Clunia II: la epigrafía de Clunia. Madrid: Ministerio de Cultura (= ERClunia).), enquadrável, como as restantes desta temática, no século I a. C. O motivo constituirá cópia de um modelo helenístico, considerando que não terá chegado a existir cavalaria pesada na Celtibéria (Quesada Sanz, 2002-2003, pp. 85-87Quesada Sanz, F. (2002-2003). “Innovaciones de raíz helenística en el armamento y tácticas de los pueblos ibéricos desde el siglo III a. C.”. Cuadernos de Prehistoria y Arqueología de la UAM, 28-29, pp. 69-94. DOI: https://doi.org/10.15366/cupauam2003.29.005 ; Simón Cornago, 2017Simón Cornago, I. (2017). “Los jinetes de las estelas de Clunia”. Palaeohispanica, 17 (= Acta Palaeohispanica XII), pp. 383-406.). Será de referir que, no mundo clássico, a presença de imagens de armas em monumentos funerários se torna comum na época helenística, aparentemente com o propósito de representar o defunto como herói (Polito, 1997, p. 857Polito, E. (1997). “Trofeo e fregio d’armi”. Em: Enciclopedia dell’Arte Antica. Roma: Enciclopedia Italiana, pp. 852-862.).

É plausível que possam confluir na representação incompleta da estela viseense influências diversas, próximas e distantes, tanto em termos geográficos como cronológicos, passíveis de perspetivas várias de leitura simbólica, mas que convocam, decerto, a ideia de comemoração ou heroicização do defunto, como se verá.

Abaixo da figuração, tangente ao escudo, surge a cartela epigrafada, rebaixada e com formato quadrilateral, mas ligeiramente enviesada, com o ângulo superior esquerdo mais abaixo que o direito. Apresenta praticamente o mesmo enviesamento que o corte inferior infligido ao suporte.

De ambos os lados, mas sobretudo no direito, a face anterior mostra diversos golpes e esboroamentos junto às arestas, que afetam, sobretudo, a representação perimétrica do escudo, não atingindo a inscrição.

3. O CONTEÚDO TEXTUAL

 

O texto centra-se num campo epigráfico horizontalizado, definido por rebaixe e tendencialmente retangular, em que os cantos surgem algo arredondados. Encontra-se dividido em quatro regras que tendem a alinhar-se pelo lado esquerdo da cartela. Não obstante, este alinhamento não é rigoroso, verificando-se que a segunda linha se inicia com ligeiro avanço relativamente à primeira e às subsequentes, que regulam entre si, mas com arranque mais à esquerda que as anteriores. A leitura proposta é como segue:

MVNIM/ENTOS • ES(t) • / LOBESIOS /

CAVCIRI • F(ilius) •

A tradução pode aproximar-se da seguinte: Monumento (sepulcral). Lobésio, filho de Cauciro.

Os carateres capitais apresentam ampla influência do registo cursivo, bem patente em praticamente todas as letras. Isso é bastante evidente no E que inicia a segunda linha, grafado com recurso a dois traços verticais paralelos, mas não segue a mesma opção aquele que se encontra no final da mesma, nem o da linha seguinte; no primeiro caso há haste vertical e três barras horizontais largas, em que a mediana se encontra mais próxima da superior, e, no segundo, as barras são mais estreitas, com a central mais aproximada à inferior, não estando horizontais por seguirem a inclinação da haste para a frente. O único F, que é a última letra do texto, aproxima-se da cursividade do primeiro E ao estar grafado com uma haste plena associada a uma diminuta que é paralela na parte superior. Os MM resultam da gravação lado a lado de dois AA sem travessão, como o da última linha, com vértices mais ou menos arredondados ou incompletos. Também os NN têm por base AA pelo que as hastes direitas, encurvadas, surgem com inclinação para a frente, sendo que o da segunda linha apresenta todas as hastes desarticuladas. Os SS são muitíssimos esguios, por vezes quase retilíneos, e com inclinações variadas. Os OO, que tendem a ser circulares, destacam-se pela sua pequenez, tal como maioritariamente os II. Os CC, estreitos e de curvaturas imperfeitas. O único V apresenta a haste esquerda mais aberta. O T, na segunda linha, apresenta barra curta e a descer da esquerda para a direita. A haste e barra do L que inicia a linha seguinte unem em curva e a letra apresenta ligeira inclinação para trás, o que não se repercute nos restantes carateres, com inclinação para diante. As panças do B, tal como a do R da linha subsequente, são muito contidas, não unindo ao meio da haste.

A interpontuação é redonda e produzida por puncionamentos profundos. Surge apenas na segunda e quarta linhas, separando palavras de abreviaturas e indicando a existência destas no final de cada uma das regras; deste modo, está ausente, quer no final da primeira linha, na qual a palavra munimentos se inicia, pois encontra-se translineada, quer na terceira, em que o antropónimo Lobesios está completo.

A gravação não segue um perfil anguloso e resultou bastante irregular, tanto em termos de profundidade, como de largura. Transmite a ideia de um domínio ainda fruste da arte de lapicida, titubeante em face do trabalho escultórico, cuja expressão se afigura mais evoluída. Plausivelmente estas diferenças representam a intervenção de artesãos distintos.

3.1. Análise linguística

 

O que mais chama a atenção no texto é a sua simplicidade quase esquemática em que as terminações das formas substantivas em -os lhe conferem uma feição linguística que se afigura remeter para um substrato pré-romano, Celta ou Lusitano. Em simultâneo, regista-se uma conjeturável forma verbal - quiçá expressa com omissão do -t final, que poderia corresponder a alguma manifestação da oralidade ou resultar meramente de incompreensão da flexão - à qual poderá porventura associar-se um sentido genérico de estar ou repousar, se outro valor não tiverem esses grafemas.

Aquelas formas desinenciais estão patentes no idiónimo do indivíduo que interpretamos como defunto e na palavra inicial que, com toda a verosimilhança, devemos aproximar da palavra latina monumentum /monimentum, com significado de elemento material comemorativo de uma pessoa ou evento, inclusive de natureza funerária, quer se pense em construção arquitetónica ou simplesmente num suporte epigráfico. A palavra latina é neutra, sendo monumentum, -i a sua forma mais corrente, ainda que monimentum surja como variante gráfica comum (Denton, 2019, p. 24Denton, T. A (2019). Monumenta and Historiographical method in Livy’s Ab Vrbe Condita. Denver: University of Colorado (Phd dissertation).). Não obstante, estão epigraficamente atestadas variantes do termo como forma masculina, tanto como monumentus (CIL, VI, 27977; CIL, X, 3750; CIL, XIV, 16610), como munimentus (CIL, II 266; CIL, VI 20989), sendo esta alteração do neutro um aspeto bem comprovado nas inscrições latinas, inclusive há muito notado no contexto hispânico (cf. Carnoy, 1906, pp. 226-229Carnoy, A. J. (1906). Le Latin d’Espagne d’après les inscriptions. 2ème ed. Bruxelles: Mish & Thron.).

A forma desinencial -os está presente nas línguas paleohispânicas fragmentariamente documentadas, enquanto terminação nominal para o nominativo dos temas em -o, como no Celtibérico. Mas por essa mesma razão está também presente no Itálico, tal como se encontra a terminação -i para o genitivo singular, do mesmo modo que em Céltico, mas não no Celtibérico (Beltrán e Jordán, 2019, pp. 251-257Beltrán Lloris, F. e Jordán Cólera, C. (2019). “Writing and language in Celtiberia”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 240-303.), desconhecendo-se as terminações do caso em causa no Lusitano (Prósper, 2008Prósper, B. M. (2008). “Lusitanian: A non-celtic Indo-European language of western Hispania”. Em: García Alonso, J. L. (Ed.). Celtic and other Languages in Ancient Europe. Salamanca: Ediciones Universidad de Salamanca, pp. 53-64. e 2010bPrósper, B. M. (2010b). “La lengua lusitana en el marco de las lenguas indoeuropeas occidentales y su relación con las lenguas itálicas”. Em: Carrasco, G. e Oliva, J. C. (Coords.). El Mediterráneo Antiguo: Lenguas y Escrituras. Cuenca: Universidad de Castilla-La Mancha, pp. 361-391.; Luján, 2019, p. 315Luján, E. R. (2019). “Language and writing among the Lusitanians”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (Eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 304-334.).

O local de aparecimento desta inscrição corresponde à área de distribuição dos testemunhos da língua pré-romana que se vem definindo como Lusitano. Esta apenas se documenta por meio da sua perduração fragmentária em época romana através da utilização do alfabeto latino, devendo ter sido a língua falada na área ocidental da Hispânia, mas há que ter a precaução de perceber que os estudos arqueológicos e linguísticos contemporâneos apontam também para a presença, neste território, de falantes de línguas célticas (Prósper, 2010bPrósper, B. M. (2010b). “La lengua lusitana en el marco de las lenguas indoeuropeas occidentales y su relación con las lenguas itálicas”. Em: Carrasco, G. e Oliva, J. C. (Coords.). El Mediterráneo Antiguo: Lenguas y Escrituras. Cuenca: Universidad de Castilla-La Mancha, pp. 361-391.; Wodtko, 2017Wodtko, D. (2017). Lusitano: lengua, escritura, epigrafia. AELAW Booklet, 4. Zaragoza: Prensas de la Universida de Zaragoza. ; Luján, 2019Luján, E. R. (2019). “Language and writing among the Lusitanians”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (Eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 304-334.). Recorde-se que um antropónimo Ablonios patenteado por um grafito ante cocturam dum grande recipiente contentor em Castrejón de Capote (Higuera la Real, Badajoz), datável de finais do século II a. C. (Berrocal, 1989, pp. 258-259 e 288Berrocal, L. (1989). “El asentamiento céltico del Castrejón de Capote (Higuera la Real, Badajoz)”. Cuadernos de Prehistoria y Arqueología de la UAM, 16, pp. 245-295. DOI: https://doi.org/10.15366/cupauam1989.16.011 ; 2005, p. 483Berrocal, L. (2005). “The Celts of the Southwestern Iberian Peninsula”. e-Keltoi, 6, pp. 481-496.), tem sido apontado como indeterminável do ponto de vista linguístico (De Hoz, 2013, p. 88De Hoz, J. (2013). “La epigrafía lusitana y la intersección de religión y lengua como marcador identitário”. Revista da Faculdade de Letras: Ciências e técnicas do Património,12, pp. 87-98.).

O texto do altar com a dedicatória Deibabor igo Deibobor Vissaieigobor, uma muito citada epígrafe viseense (Fernandes, Carvalho e Figueira, 2008Fernandes, L. S., Carvalho, P. S. e Figueira, N. (2008). “Uma nova ara votiva de Viseu (Beira Alta, Portugal)”. Sylloge Epigraphica Barcinonensis, 6, pp. 185-189. e 2009Fernandes, L. S., Carvalho, P. S. e Figueira, N. (2009). “Divindades indígenas numa ara inédita de Viseu”. Palaeohispanica, 9 (= Acta Palaeohispanica X), pp. 143-155.; AE, 2008, 643; HEp, 17, 2008, 255; AE, 2009, 505; Vallejo, 2013, p. 21, n.º 6Vallejo, J. M. (2013). “Hacia uma definición del Lusitano”. Palaeohispanica, 13 (= Acta Palaeohispanica XI), pp. 273-291.), apesar de não apresentar qualquer palavra em comum com as restantes inscrições que se creditam como lusitanas, as quais, todavia, são em número reduzido (5/6 exemplares), tem vindo, mesmo assim, a ser considerado em pé de igualdade com elas (Gorrochategui e Vallejo, 2010Gorrochategui, J. e Vallejo, J. M. (2010). “Lengua y onomástica: las inscripciones lusitanas”. Em: Schattner, Th. e Santos, M. J. (Eds.). Porcom, Oilam, Taurom. Cabeço das Fráguas: o santuário no seu contexto. Iberografias, 6. Guarda: Centro de Estudos Ibéricos, pp. 71-80. e 2015Gorrochategui, J. e Vallejo, J. M. (2015). “Langues fragmentaires et aires onomastiques : le cas de la Lusitanie et de l’Aquitaine”. Em: Dupraz, E. e Sowa, W. (Dir.). Genres épigraphiques et langues d’attestation fragmentaire dans l’espace méditerranéen. Rouen: Presses universitaires de Rouen et du Havre, pp. 337-356.; Estarán Tolosa, 2016, pp. 270-272Estarán Tolosa, M. J. (2016). Epigrafía bilingüe del Occidente romano: el latín y las lenguas locales en las inscripciones bilingües y mixtas. Zaragoza: Prensas de la Universidad de Zaragoza.; Luján, 2019, p. 306Luján, E. R. (2019). “Language and writing among the Lusitanians”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (Eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 304-334.), ainda que sem unanimidade (Prósper, 2011, pp. 256-257Prósper, B. M. (2011). “The instrumental case in the thematic noun inflection of Continental Celtic”. Historische Sprachforschung / Historical Linguistics, 124, pp. 250-267. DOI: https://doi.org/10.13109/hisp.2011.124.1.250 ; 2021, pp. 434-435Prósper, B. M. (2021). “The Lusitanian oblique cases revisited new light on the dative endings”. Em: González Iglesias, J. A., Méndez Dosuna, J. e Prósper, B. M. (Eds.). Curiositas nihil recusat: Studia Isabel Moreno Ferrero dicata. Salamanca: Universidad de Salamanca, pp. 427-442.). Esta inscrição é particularmente relevante por ter a mesma procedência da que ora se apresenta, mas tem natureza claramente distinta ao tratar-se de um altar votivo apresentando teónimo(s) e/ou seus epítetos com terminações, bem como palavras, presumivelmente lusitanas. Aliás, as restantes inscrições atribuíveis à língua lusitana têm esta vinculação ao mundo da religiosidade autóctone, independentemente do seu enquadramento mais público ou privado (Prósper, 2010aPrósper, B. M. (2010a). “Cabeço das Fráguas y el sacrifício indoeuropeo”. Em: Schattner, Th. e Santos, M. J. (Eds.). Porcom, Oilam, Taurom. Cabeço das Fráguas: o Santuário no seu Contexto. Iberografias, 6. Guarda: Centro de Estudos Ibéricos, pp. 63-70.; Gorrochategui e Vallejo, 2010Gorrochategui, J. e Vallejo, J. M. (2010). “Lengua y onomástica: las inscripciones lusitanas”. Em: Schattner, Th. e Santos, M. J. (Eds.). Porcom, Oilam, Taurom. Cabeço das Fráguas: o santuário no seu contexto. Iberografias, 6. Guarda: Centro de Estudos Ibéricos, pp. 71-80.; Ribeiro, 2014Ribeiro, J. C. (2014). “Damos-te esta ovelha, ó Trebopala!: a invocatio lusitana de Cabeço das Fráguas”. Conimbriga, 53, pp. 99-144.; Wodtko, 2017Wodtko, D. (2017). Lusitano: lengua, escritura, epigrafia. AELAW Booklet, 4. Zaragoza: Prensas de la Universida de Zaragoza. ; Luján, 2019Luján, E. R. (2019). “Language and writing among the Lusitanians”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (Eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 304-334.).

O certo é que a literacia neste contexto hispânico apenas irrompe com a chegada de Roma (De Hoz, 1995, pp. 3-4De Hoz, J. (1995). “Las sociedades celtibérica y lusitana y la escritura”. Archivo Español de Arqueología, 68, pp. 3-30. DOI: https://doi.org/10.3989/aespa.1995.v68.395 ) e, deste modo, é natural que a epigrafia reflita uma situação de bilinguismo ou diglossia entre os falantes de Lusitano (Luján, 2019, pp. 306-309Luján, E. R. (2019). “Language and writing among the Lusitanians”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (Eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 304-334.).

Mas a inscrição que se apresenta, se vincável a esta língua paleohispânica, documentará, pela primeira vez, a sua associação à comunicação funerária, com vocábulos ou finais que podemos considerar da língua autóctone, quer na antroponímia, quer em outro vocabulário, designadamente o caso de munimentos, ainda que não se possa cabalmente asseverar se este representará uma forma totalmente indígena ou um empréstimo linguístico latino com adaptação desinencial indígena.

O nome do defunto, Lobesios, pode integrar-se num conjunto de formas antroponímicas bem documentadas com alternância -v- / -b-, patentes na Callaecia e Lusitania, como Louesius, Louesia, Louessius, Lobesa, Lobessa, Lobessa. A grafia com -b- aparece apenas na área lusitana. Louesius, com mais de uma dúzia de testemunhos na Lusitânia (IRCP, 621, Beirã, MarvãoEncarnação, J. d’ (1984). Inscrições romanas do conuentus Pacencis: subsídios para o estudo da romanização. Coimbra: [Universidade], Faculdade de Letras, Instituto de Arqueologia (= IRCP).; CIL, II, 165, Benavila, Avis; AE, 1977, 413, Brozas, Cáceres; CIgaed, 126 e 170, Idanha-a-VelhaSá, A. (2007). Ciuitas Igaeditanorum: os deuses e os homens. Idanha-a-Nova: Município (= CIgaed) ; HEp, 17, 2008, 226, Capinha, Fundão; AE, 1984, 463, Montoito, Redondo; CIL, II, 2380 + AE, 1956, 157, Pombeiro da Beira, Arganil; AE, 1985, 533, Vale de Prazeres, Fundão; HEp, 15, 2006, 537, Casas da Ribeira, Cardigos; AE, 1977, 397 + CILCC, II, 790, Trujillo, CáceresEsteban Ortega, J. (2012). Corpus de inscripciones latinas de Cáceres, II: Turgalium. Cáceres: Universidad de Extremadura (= CILCC II).; Abascal, 2015, pp. 233-234Abascal Palazón, J. M. (2015). Estudios sobre la tradición manuscrita de la epigrafía hispano-romana. Madrid: Real Academia de la Historia., Add. n.º 6, Llano de los Roncos, Chillón), ademais da sua utilização como gentilício por indivíduos deslocados (AE, 1987, 736, Tarragona; EE, IX, 1063, Deva, Chester), é um dos antropónimos que se consideram, pela sua elevada frequência e exclusividade, entre os característicos deste contexto peninsular, também por apresentar distribuição em coerência com a das inscrições na língua identificada como Lusitano (Vallejo, 2005, pp. 332-334Vallejo, J. M. (2005). Antroponimia indígena de la Lusitania romana. Vitoria: Universidad del País Vasco.; Gorrochategui e Vallejo, 2015, 349-350Gorrochategui, J. e Vallejo, J. M. (2015). “Langues fragmentaires et aires onomastiques : le cas de la Lusitanie et de l’Aquitaine”. Em: Dupraz, E. e Sowa, W. (Dir.). Genres épigraphiques et langues d’attestation fragmentaire dans l’espace méditerranéen. Rouen: Presses universitaires de Rouen et du Havre, pp. 337-356.). Os testemunhos fora deste território são escassos e associados ao Noroeste peninsular: a forma masculina documenta-se ligada a Interamici em Cacabelos (IRPL, 222Diego Santos, F. (1986). Incripciones romanas de la provincia de León. León: Diputación Provincial de León (= IRPL).) e em Oliva de Plasencia (CIL, II, 826), em ambos os casos como patronímico, e a feminina em Vinhais (CIL, II, 2467). Não obstante, a forma Lobesios é original, não só pela terminação, já que a grafia do radical com -b- apenas se vê até ao presente associada às formas femininas Lobesa (CIL, II, 165, Benavila; CIL, II, 5246, Viseu; CILCC, II, 870, VillamesíasEsteban Ortega, J. (2012). Corpus de inscripciones latinas de Cáceres, II: Turgalium. Cáceres: Universidad de Extremadura (= CILCC II).) e Lobessa (CIL, II, 381 e 387, Condeixa-a-Nova; CIL, II, 79, Leiria; Palomar, 1957, p. 78, MéridaPalomar Lapesa, M. (1957). La onomástica personal pre-latina de la antigua Lusitania: estudio lingüístico. Theses et studia philologica salmanticensia, 10. Salamanca: Consejo Superior de Investigaciones Científicas [etc.].) e a um unicum Lobaenus (AE, 1986, 302, Fornos de Algodres), mostrando claro arreigamento lusitano. A etimologia do nome parece não ser de simples estabelecimento. Recorde-se que Prósper (2002, p. 410)Prósper, B. M. (2022). “The sibilant sounds of Hispano-Celtic: phonetics, phonology and orthography”. Journal of Language Relationship, 20:1-2, pp. 1-24., não dando por assente que a alternância -v- / -b- apontasse um mesmo nome, até porque não se encontrava documentado o sufixo -yo- nas formas com -b-, propôs a possibilidade de a forma feminina Lobessa remontar a *leubhes-ā com monotongação da sílaba inicial, entendendo-a, portanto, como um correlato do lituano liaupse “glorificação”, e Vallejo (2005, p. 334)Vallejo, J. M. (2005). Antroponimia indígena de la Lusitania romana. Vitoria: Universidad del País Vasco. virá a sugerir a relação do radical com o grau pleno 0 da raiz *lou- “lavar” (IEW, p. 692Pokorny, J. (1959). Indogermanisches etymologisches Wörterbuch. Bern e München: Francke Verlag (= IEW).). Entre ambas formas femininas verifica-se um claro apartamento geográfico, pois a que apresenta geminação consonântica, com exceção do caso emeritense - que não devemos sobrevalorizar por se tratar da capital provincial - tem uma incidência no litoral lusitano e, curiosamente, em função cognominal, enquanto a outra apenas assume presença nas terras mais interiores, incluindo Viseu.

O patronímico Caucir(i)us tem também uma incidência lusitana exclusiva e, até ao presente, documentava-se no territorium de Turgalium, na província de Cáceres, com apenas dois testemunhos em que assume, como no caso viseense, o papel de patronímico (CILCC, II, 688, Santa Cruz de la SierraEsteban Ortega, J. (2012). Corpus de inscripciones latinas de Cáceres, II: Turgalium. Cáceres: Universidad de Extremadura (= CILCC II).; CILCC, II, 706, Santa Marta de MagascaEsteban Ortega, J. (2012). Corpus de inscripciones latinas de Cáceres, II: Turgalium. Cáceres: Universidad de Extremadura (= CILCC II).), inclusive de indivíduos do género masculino, o mesmo acontecendo num exemplo de procedência desconhecida que se atribui igualmente à Lusitânia (HEp, 7, 1997, 173). Há, ainda, uma variante Cauquir(i)us (CILCC, II, 888, VillamesíasEsteban Ortega, J. (2012). Corpus de inscripciones latinas de Cáceres, II: Turgalium. Cáceres: Universidad de Extremadura (= CILCC II).). O radical deste nome tem presença no interior lusitano e extensão à Celtibéria (Vallejo, 2005, p. 271Vallejo, J. M. (2005). Antroponimia indígena de la Lusitania romana. Vitoria: Universidad del País Vasco.). Segundo proposta que remonta a Palomar Lapesa (1957, p. 62)Palomar Lapesa, M. (1957). La onomástica personal pre-latina de la antigua Lusitania: estudio lingüístico. Theses et studia philologica salmanticensia, 10. Salamanca: Consejo Superior de Investigaciones Científicas [etc.]. e tem granjeado aceitação posterior (Albertos Firmat, 1966, p. 82Albertos Firmat, M. L. (1966). La onomástica personal primitiva de Hispania: Tarraconense y Bética. Theses et studia philologica salmanticensia, 13. Salamanca: Consejo Superior de Investigaciones Científicas [etc.].; Vallejo, 2005, p. 272Vallejo, J. M. (2005). Antroponimia indígena de la Lusitania romana. Vitoria: Universidad del País Vasco.) relacionar-se-á com raiz *keu- “encurvar” (IEW, p. 588Pokorny, J. (1959). Indogermanisches etymologisches Wörterbuch. Bern e München: Francke Verlag (= IEW).) com ampliação em -k-, ainda que possa ser mais ajustada a raiz *kau- “grito, uivo” (IEW, p. 535Pokorny, J. (1959). Indogermanisches etymologisches Wörterbuch. Bern e München: Francke Verlag (= IEW).), u. g. em relação com formas do lit. kaũkti “uivar” (de cães e lobos) ou do gr. kauāks “espécie de gaivota”.

No campo da morfologia nominal lusitana, não encontramos documentadas terminações de nominativo singular nem tão-pouco de genitivo (Luján, 2019, pp. 315-319Luján, E. R. (2019). “Language and writing among the Lusitanians”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (Eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 304-334.; Prósper, 2021, pp. 438-440Prósper, B. M. (2021). “The Lusitanian oblique cases revisited new light on the dative endings”. Em: González Iglesias, J. A., Méndez Dosuna, J. e Prósper, B. M. (Eds.). Curiositas nihil recusat: Studia Isabel Moreno Ferrero dicata. Salamanca: Universidad de Salamanca, pp. 427-442.). No entanto, tanto munimentos como Lobesios se afiguram formas nominativas que poderão refletir a morfologia de uma língua indígena. Em face da localização da inscrição podemos equacionar que seja essa língua o Lusitano, mas também não podemos perder de vista a possibilidade de se tratar de língua ou dialeto celta. O genitivo Cauciri está de acordo com a flexão latina, mas desconhecendo-se as terminações de genitivo no Lusitano não se poderá ser concludente a este propósito, tanto mais que a terminação -i é caraterística nos genitivos nominais de tema -o das línguas indo-europeias, como o Céltico ou o Itálico, tal como aludido.

Um aspeto a realçar na formulação onomástica pessoal é a utilização de um idiónimo associado a um patronímico seguido da abreviatura f. referente a filius. Do ponto de vista jurídico é a nomenclatura comum entre a população peregrina do Ocidente peninsular. Nas inscrições lusitanas ditas de caráter público, em que há referência aos escribas das mesmas, como em Arroyo de la Luz I e em Lamas de Moledo (cf. Luján, 2019, pp. 330-331, CC.03.01 e VIS.01.01Luján, E. R. (2019). “Language and writing among the Lusitanians”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (Eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 304-334.), os seus nomes surgem distintamente em latim - Ambatus, na primeira; Rufinus e Tiro, na segunda -, tal como ocorre com o dedicante do altar viseense - Albinus Chaereae f. -, verificando-se que apenas o primeiro antropónimo elencado reporta ao onomástico indígena. Porém, enquanto, neste último caso, o dedicante apresenta estrutura onomástica peregrina, nos anteriores, os escreventes unicamente se identificam pelo idiónimo. Será de realçar, ainda, que, se tão-só no primeiro caso a onomástica é indígena, ela não é exclusiva da Lusitânia (Vallejo, 2005, pp. 134-140Vallejo, J. M. (2005). Antroponimia indígena de la Lusitania romana. Vitoria: Universidad del País Vasco.), e que os restantes antropónimos são latinos, com exceção do patronímico Chaerea, de plausível origem grega (Solin, 2003, p. 1387Solin, H. (2003). Die griechischen Personennamen in Rom: ein Namenbuch. 2, völlig neu bearbeitete Auflage. Corpus Incriptionum Latinarum. Auctarium, Series Nova, 2. Berlin; New York: De Gruyter. 3 vol.).

Por último, devemos também comentar a forma da segunda linha, que presumimos poder corresponder a forma verbal, plausivelmente latina. Não tem paralelo com as exíguas formas verbais lusitanas documentadas: 3ª pessoa do sing. rueti em Arroyo de la Luz III e 3ª pessoa do pl. doenti em Lamas de Moledo (Villar e Pedrero, 2001, pp. 257-258Villar, F. e Pedrero, R. (2001). “La nueva inscripción lusitana: Arroyo de la Luz III”. Em: Villar, F. e Fernández Álvarez, M. P. (Eds.). Religión, lengua y cultura prerromanas de Hispania: actas del VIII Coloquio de Lenguas y Culturas Paleohispánicas. Salamanca: Ediciones Universidad de Salamanca, pp. 663-698.; Prósper, 2002, pp. 63-64 e 84-87Prósper, B. M. (2022). “The sibilant sounds of Hispano-Celtic: phonetics, phonology and orthography”. Journal of Language Relationship, 20:1-2, pp. 1-24.; Luján, 2019, pp. 319-320Luján, E. R. (2019). “Language and writing among the Lusitanians”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (Eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 304-334.). Tão-pouco se encontra paralelo no celtibérico (Beltrán e Jordán, 2019, pp. 257-259Beltrán Lloris, F. e Jordán Cólera, C. (2019). “Writing and language in Celtiberia”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 240-303.). Em face da estrutura textual, pensamos na 3ª pessoa do singular do verbo sum com queda do grafo final. A omissão do -tfinal não deixa de concitar interesse. Pode, evidentemente, ser uma característica do latim vulgar, mas não será de excluir uma eventual influência do falar indígena. Em latim, a perda das oclusivas dentais no final, nomeadamente em desinências verbais, é um fenómeno bem documentado, como demonstram as inscrições pompeianas (Väänänen, 1937, p. 123Väänänen, V. (1937). Le latin vulgaire des inscriptions pompéiennes. Helsinki: Société de Littérature Finnoise (Annales Academiae Scientiarum Fennicae; B XL, 2).). Não obstante, recentemente também se postulou a ocorrência da queda de dentais finais no âmbito do celtibérico (Prósper, 2022, pp. 19-21Prósper, B. M. (2022). “The sibilant sounds of Hispano-Celtic: phonetics, phonology and orthography”. Journal of Language Relationship, 20:1-2, pp. 1-24.), pelo que será prudente não afastar por completo que o fenómeno aqui presente ocorra por alguma influência autóctone.

4. CRONOLOGIA

 

Uma questão crucial que devemos ainda colocar é a da cronologia desta peça. O contexto arqueológico não é, à partida, definidor deste aspeto. Como vimos, a estela encontrou-se em reaproveitamento no embasamento de muro associado a construção contemporânea que foi alvo de incêndio em 1923. A peça estava aí amortizada como material de construção, devendo pressupor-se a sua mobilização para o local.

As necrópoles de época romana estão afastadas do lugar de achado da estela. A localização dos espaços funerários é reconhecível junto às portas da cidade (Fig. 6), tendo sido identificados enterramentos a sul, na zona do Cerrado, a sudeste, na de S. Miguel do Fetal, a nordeste, na avenida Emídio Navarro, e a noroeste, na rua Silva Gaio/travessa da Misericórdia (Vaz, 2009, pp. 172-184Vaz, J. L. I. (2009). “Génese e evolução de um espaço urbano: Viseu das origens à ocupação árabe”. Beira Alta, 68-69, pp. 147-201.; Carvalho, Carvalho e Perpétuo, 2020, p. 114Carvalho, P. S. e Costa, F. (2020). Trabalhos Arqueológicos (sondagens de diagnóstico arqueológico e acompanhamento arqueológico à picagem e/ou demolição de paramentos) no edifício situado no Gaveto Sr.ª da Boa Morte n.º 19/21 - Rua das Ameias nº 35/39, Viseu. Relatório policopiado.). As mais próximas são as duas últimas: a primeira localiza-se na extremidade setentrional do cardus, na base da colina onde se ergueu a cidade, longe do seu topo, donde provém a estela; a segunda situa-se na extremidade ocídua do decumanus existindo maior proximidade ao local de reaproveitamento da estela.

medium/medium-AESPA-96-e16-gf6.png
Figura 6.  Localização dos principais espaços da cidade romana de Viseu e das necrópoles, com localização do achado: (1) forum; (2) anfiteatro; (3) necrópole norte-ocidental; (4) necrópole norte-oriental; (5) necrópole de São Miguel; (6) necrópole do Cerrado (elaboração própria).

O início da utilização desta última necrópole, identificada ao longo da rua Silva Gaio e na travessa da Misericórdia, poderá remontar à época de Augusto se partirmos do princípio que se estruturou aquando do delineamento da cidade, na altura em que se edificaram a muralha inicial e a sua porta norte, ainda que em escavação não se tenha encontrado qualquer registo estratigráfico com material que o comprove. Nela foram identificadas 45 sepulturas de inumação cuja tipologia parece apontar para uma data tardia, dos séculos III-IV, apesar de os materiais associados não permitem datações precisas. Contudo, de forma avulsa, sem que estivessem diretamente associados a sepulturas, surgiram materiais fragmentados alto-imperiais e, inclusive, materiais da Idade do Ferro, dado que esta área coincide com a do povoado pré-romano. Há, todavia, duas inscrições funerárias, igualmente detetadas durante as intervenções arqueológicas realizadas no contexto das obras dinamizadas pela ViseuPolis, que se podem relacionar com esta necrópole e que apontam inequivocamente para cronologias alto-imperiais.

Uma corresponde ao fragmento de uma estela, ou talvez de estela-altar, descoberto em intervenção na calçada de Viriato e zonas envolventes, entretanto publicado (FE 2017, 598), o qual talvez se possa datar da transição do século I para o II, ou mesmo já deste. Mas a outra, seguramente uma estela, descoberta encastrada numa parede interior do segundo piso do edifício nº 37 do largo Pintor Gata durante trabalhos de acompanhamento arqueológico à remodelação do imóvel, realizados em 2019, terá uma datação que poderemos enquadrar na primeira metade do século I. Esta encontra-se em estudo, tendo sido já apresentada uma breve notícia da mesma (Silva, 2021, pp. 90 e 93Silva, A. C. F. (2021). “O castro de Baiões e a organização gentílica da Beira Alta: de Baiões a Lafões”. Em: I Jornadas de Arqueologia Vouzela-Lafões: atas. Vouzela: Câmara Municipal, pp. 77-99.). Acresce que, na remodelação de um edifício no largo da Sé, também se detetou, em 1999, sem contexto estratigráfico, um fragmento de uma placa funerária, datável dos meados do século I (FE 2017, 616), destinada a um monumento tumular, e que, com igual plausibilidade, também se deverá associar a esta necrópole. Assim, a hipótese de uma cronologia alta para o início da utilização da necrópole tem conforto do ponto de vista epigráfico. Associar-se-á também a esta mesma necrópole norte-ocidental um outro achado epigráfico ocorrido, em 1993, em edifício da rua Augusto Hilário (Vaz, 1997, pp. 271-272, n.º 76Vaz, J. L. I. (1997). A ciuitas de Viseu: espaço e sociedade. Coimbra: CCRC.), que poderá ser já posterior aos finais do século I. Ainda seguramente relacionado com esta necrópole, há a referir um fragmento de cabeceira de estela funerária, com um crescente lunar de pontas voltadas para baixo, aparecido no nº 2 da calçada da Vigia durante a demolição de paredes interiores do edifício, no qual se encontrava reaproveitado (Carvalho, 2003, p. 7Carvalho, P. S. (2003). Trabalhos arqueológicos na Calçada da Vigia, nº 2, Viseu. Relatório policopiado.).

Da necrópole norte-oriental associada à avenida Emídio Navarro há notícias da sua descoberta em 1951, aquando de obras, tendo sido a mesma referida por José Coelho num dos seus Cadernos de Notas Arqueológicas (Coelho, 1951, fls. 31-33Coelho, J. (1951). Caderno de Notas Arqueológicas nº 102 (25-03-1951 a 02-08-1951). s/l. Manuscrito.), ainda que já se conhecessem epígrafes dessa zona (CIL, II, 409; Aragão, 1895, p. 250Aragão, M. P. F. (1895). Vizeu: apontamentos historicos. Tomo II. Viseu: Typographia Popular. ). Identificaram-se, então, várias sepulturas de inumação com tégulas em telhado de duas águas - tipo também presente na necrópole da rua Silva Gaio - e uma “caixa quadrangular de 4 lajes ao alto coberta com uma pequena laje, com cerca de 0,70 m de altura secção quadrada, com cerca de 0,40 m de lado” que este estudioso atribuiu à Idade do Bronze. Se este último relato aponta para sepultura de incineração, com base no que se conhece é, todavia, difícil precisar uma cronologia.

Na rua Direita, junto ao edifício nº 211, encontrou-se, em 2000, durante trabalhos de acompanhamento arqueológico no âmbito do projeto de Urbanismo Comercial - PROCOM, um fragmento de placa funerária (FE 2017, 600) associado a terras negras com tegulae e imbrices, datável da primeira metade do século I. É um achado relativamente próximo do local de reaproveitamento da estela em estudo, mas mais deslocado para nordeste, onde se localiza esta última necrópole. Esse ponto situa-se para lá do sítio de cruzamento do cardus e do decumanus da cidade antiga e do local para o qual se propõe a existência de um anfiteatro (Carvalho, Carvalho e Perpétuo, 2020, pp. 211-213Carvalho, P. S. e Costa, F. (2020). Trabalhos Arqueológicos (sondagens de diagnóstico arqueológico e acompanhamento arqueológico à picagem e/ou demolição de paramentos) no edifício situado no Gaveto Sr.ª da Boa Morte n.º 19/21 - Rua das Ameias nº 35/39, Viseu. Relatório policopiado.).

No referente à peça que ora se apresenta, o tipo de suporte não permite por si só grande conclusão neste contexto. Conhecemos o uso da estela desde os tempos mais recuados do arranque do hábito epigráfico no Ocidente hispânico, embora o elemento ornamental pareça ausente nos exemplos mais remotos. Como se evidenciou aquando da apresentação do suporte, a temática marcial pode apontar para influências claramente hispânicas, sem esquecer que também o mundo helenístico pode estar na base deste tipo de registo, assente na ideia de heroicização do defunto, mas tal não é suficiente para presumir a sua grande antiguidade, nem tão-pouco a técnica escultórica permite, no estado atual do nosso conhecimento, definir a questão.

Apenas os elementos internos podem apoiar uma tentativa de sugestão de cronologia. O estatuto jurídico do indivíduo identificado unicamente pode apontar uma cronologia à escala alto-imperial, mas os aspetos linguísticos que se apresentaram são, à partida, mais condicentes com uma fase incipiente do domínio do latim e do hábito epigráfico.

A paleografia muito marcada pelas formas arcaizantes e cursivas enquadra-se bem no conhecimento que há relativamente a esta escrita no século I d. C. e, em concreto, no respeitante às inscrições lusitanas, uma vez que dificilmente serão anteriores à viragem da era (Edmondson, 2002, p. 52Edmondson, J. (2002). “Writing Latin in the province of Lusitania”. Em: Cooley, A. E. (Ed.). Becoming Roman, Writing Latin? Literacy and Epigraphy in the Roman West. Portsmouth: Journal of Roman Archaeology, pp. 41-60.). A inscrição rupestre de Lamas de Moledo é, neste particular, eloquente, também ela apontando para uma cronologia alta (Simón Cornago, 2019Simón Cornago, I. (2019). “La paleografía y datación de la inscripción lusitana de Lamas de Moledo”. Mélanges de la Casa de Velázquez, 49:1, pp. 159-184. DOI: https://doi.org/10.4000/mcv.9762 ; Ribeiro e Pires, 2021Ribeiro, J. C. e Pires, H. (2021). “Da fixação textual das inscrições lusitanas de Lamas de Moledo, Cabeço das Fráguas e Arronches: o contributo do Modelo de Resíduo Morfológico (MRM), seus resultados e principais consequências interpretativas”. Palaeohispanica, 21, pp. 301-352.). Deste ponto de vista paleográfico, distancia-se claramente dos ductus da inscrição do altar dedicado aos deuses e deusas da cidade, para o qual se sugeriu uma cronologia de meados ou da segunda metade do século I (Fernandes, Carvalho e Figueira, 2009, p. 145Fernandes, L. S., Carvalho, P. S. e Figueira, N. (2009). “Divindades indígenas numa ara inédita de Viseu”. Palaeohispanica, 9 (= Acta Palaeohispanica X), pp. 143-155.), embora não nos pareça desadequado pensar nos inícios do seguinte. A ausência de uma formulação funerária desenvolvida, incluindo, por exemplo, a dedicação aos Manes, ou a indicação de idade de falecimento, bem como a verosímil identificação do defunto no nominativo, apontarão para uma cronologia alta, plausivelmente da primeira metade do século I ou mesmo em torno da viragem da era.

A necrópole associada à rua Silva Gaio é, efetivamente, a mais próxima do local de achado da estela, apesar de se encontrar de permeio o forum, cuja localização é comprovadamente coincidente com o topo do morro da Sé (Carvalho, Carvalho e Perpétuo, 2020, pp. 102-111Carvalho, P. S. e Costa, F. (2020). Trabalhos Arqueológicos (sondagens de diagnóstico arqueológico e acompanhamento arqueológico à picagem e/ou demolição de paramentos) no edifício situado no Gaveto Sr.ª da Boa Morte n.º 19/21 - Rua das Ameias nº 35/39, Viseu. Relatório policopiado.), tal como o hipotético anfiteatro se atravessaria, mirando a necrópole da avenida Emídio Navarro. A cronologia de utilização da primeira parece afigurar-se compatível com a que propomos, não se dispondo, porém, de outros argumentos para sustentar esta ligação. A segunda, para além de mais distante, fica a uma cota muito inferior, na base da colina em que assenta a cidade romana, sendo também mais incerta a sua cronologia de ocupação.

5. CONCLUSÃO

 

A ocupação pré-romana em Viseu vem-se revelando bastante expressiva ao nível do registo arqueológico, sendo que parece ser apenas no período augustano que é interrompida a exclusividade do registo material indígena. Todavia, não se perceciona um corte radical com esse passado. Inclusive, contíguo ao forum, com grande proximidade ao local onde se encontrou a estela, parece ter havido a manutenção de uma área de grandes afloramentos graníticos que terá permanecido como provável espaço público a céu aberto, monumentalizado, o qual precedia e enquadrava o acesso à esplanada forense (Carvalho, Carvalho e Perpétuo, 2020, p. 111Carvalho, P. S. e Costa, F. (2020). Trabalhos Arqueológicos (sondagens de diagnóstico arqueológico e acompanhamento arqueológico à picagem e/ou demolição de paramentos) no edifício situado no Gaveto Sr.ª da Boa Morte n.º 19/21 - Rua das Ameias nº 35/39, Viseu. Relatório policopiado.). E em intervenção arqueológica muito próxima, em edifício situado no gaveto formado pela rua Sr.ª da Boa Morte, n.º 19/21, e pela rua das Ameias, n.º 35/39, foram exumados vestígios da Idade do Ferro, designadamente contextos habitacionais que aproveitavam grandes batólitos graníticos, cronologicamente integráveis em dois momentos: um, mais antigo, provavelmente dos séculos IV-III a. C., e outro, mais recente, talvez do séc. I a. C. (Carvalho e Costa, 2020Carvalho, P. C., Carvalho, P. S. e Perpétuo, J. (2020). “A cidade romana de Viseu e os seus principais espaços públicos”. Revista Portuguesa de Arqueologia, 23, pp. 101-120.).

Em torno da mudança de era, quando o povoado se transformou em cidade, coexistiram, lado a lado, dois mundos distintos e o achado desta peça integra-se bem nesta ideia de encontro de culturas. As escavações levadas a cabo no centro histórico de Viseu nos últimos anos, tanto em espaços públicos como privados de época romana, têm registado uma brusca transição estratigráfica, revelando que as construções alto-imperiais são feitas diretamente sobre níveis do povoado da Idade do Ferro. Nos séculos I e II d. C., a área da cidade poderia rondar os 20 hectares; o perímetro amuralhado tardio rodearia uma área com cerca de 12/13 hectares (Carvalho, Carvalho e Perpétuo, 2020, pp. 114-115Carvalho, P. S. e Costa, F. (2020). Trabalhos Arqueológicos (sondagens de diagnóstico arqueológico e acompanhamento arqueológico à picagem e/ou demolição de paramentos) no edifício situado no Gaveto Sr.ª da Boa Morte n.º 19/21 - Rua das Ameias nº 35/39, Viseu. Relatório policopiado.).

A estela que agora se estuda aponta para essa fase inicial da andadura da cidade romana, que apenas na época augustana parece moldar-se. Apesar da proximidade entre o local de achado da epígrafe e as penedias adjacentes ao forum, e ainda que, à partida, com base nesta leitura espacial, pudesse ser sedutor pensar num exclusivo caráter honorífico para a mesma, observando sobretudo a inusitada plástica ostentada, supõe-se, razoavelmente, que tenha revestido carácter funerário.

Identificada em reaproveitamento, terá tido como localização original uma das necrópoles da cidade, quiçá a que ficava mais próxima do forum, tal como a placa funerária que, a pouca distância, se identificou na rua Augusto Hilário.

Sinaliza plausivelmente o enterramento de um indivíduo de estatuto peregrino. A espetacularidade plástica do suporte, infelizmente incompleto, faz pensar em alguém bem arreigado na comunidade, decerto membro da elite local nesses primórdios da fase romana da cidade, não existindo objetivamente argumentos para uma estrita caraterização do seu papel social, como uma eventual posição de auxiliar junto das legiões romanas, à semelhança do que, por exemplo, se aventou para as representações de cavaleiros das estelas discoides de Clunia (Simón Cornago, 2017, p. 398Simón Cornago, I. (2017). “Los jinetes de las estelas de Clunia”. Palaeohispanica, 17 (= Acta Palaeohispanica XII), pp. 383-406.).

A partir dos documentos epigráficos da língua lusitana, tem-se posto em evidência que, no registo escrito, ao longo da primeira metade do século I, não é o latim a utilizar-se no âmbito cultual lusitano, mas sim nos restantes géneros epigráficos, nomeadamente nos que tinham exposição pública (Estarán Tolosa, 2019, p. 62Estarán Tolosa, M. J. (2019). “Deibabor igo deibobor Vissaieigobor: notas para el estudio de la retención lingüística en la epigrafía religiosa de la Lusitania romana”. Em: Tomás García, J. e Del Prete, V. (Eds.). Imágenes, lengua y creencias em Lusitania romana. Oxford: Archaeopress, pp. 54-72.). No caso concreto do Lusitano, tem-se defendido ser provável que esta fosse a língua falada e o latim a escrita (De Hoz, 2013, p. 91De Hoz, J. (2013). “La epigrafía lusitana y la intersección de religión y lengua como marcador identitário”. Revista da Faculdade de Letras: Ciências e técnicas do Património,12, pp. 87-98.), situação de onde parecem resultar as interferências percecionadas nas inscrições com manifestações de bilinguismo.

A presente inscrição pode, porventura, trazer uma nova luz à questão da mudança linguística ao admitir-se que algumas das grafias que patenteia, inclusivamente ao nível da antroponímia, podem apontar para uma língua ou dialeto autóctone, eventualmente para o Lusitano em função da situação geográfica e do contexto onomástico, sendo, assim, demonstrativas de bilinguismo (Mullen, 2012Mullen, A. (2012). “Introduction: multiples languages, multiples identities”. En: Mullen, A. e James, P. (Eds.). Multilingualism in the Graeco-Roman worlds. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 1-35.), aparentemente por parte de alguém com competências escassas numa segunda língua, o que poderá ser particularmente interessante na análise daquele processo por incluir precisamente a referida categoria de nomes.

Recorde-se que no conjunto das inscrições enquadráveis com o Lusitano (cf. Luján, 2019, pp. 306-308Luján, E. R. (2019). “Language and writing among the Lusitanians”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (Eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 304-334.), esta categoria onomástica apenas aparece latinizada em face do conservadorismo da teonímia (Estarán Tolosa, 2019, p. 63Estarán Tolosa, M. J. (2019). “Deibabor igo deibobor Vissaieigobor: notas para el estudio de la retención lingüística en la epigrafía religiosa de la Lusitania romana”. Em: Tomás García, J. e Del Prete, V. (Eds.). Imágenes, lengua y creencias em Lusitania romana. Oxford: Archaeopress, pp. 54-72.), mas, como referimos, também se desconhece quais o nominativo singular e o genitivo lusitanos. Quiçá nesta epígrafe, em que o texto se afigura com mistura linguística, se possa invocar uma etapa mais precoce do processo de fixação escrita e de mutação. Todavia, a prudência aconselha esperar que o registo epigráfico se torne futuramente mais elucidativo nestes aspetos concretos, sabendo-se já que nos processos de contacto e de mudança linguística situações destas são passíveis de acontecer, sendo inclusive interpretáveis do ponto de vista sociolinguístico ao nível das identidades, aspeto que pode ser particularmente significativo com os nomes e no âmbito dos textos funerários (Adams, 2003, pp. 375-380 e 409-410Adams, J. N. (2003). Bilingualism and the Latin language. Cambridge: The press Syndicate of the University of Cambridge.).

A estela que se apresentou nas linhas anteriores é, com toda a certeza, mais um documento desafiante para o estudo da Antiguidade ao nível provincial e, mais uma vez, catapulta os dados referentes à ocupação antiga da cidade de Viseu como cruciais no entendimento dos processos de transmutação cultural em face da ocupação romana.

BIBLIOGRAFIA

 

Abascal Palazón, J. M. (2015). Estudios sobre la tradición manuscrita de la epigrafía hispano-romana. Madrid: Real Academia de la Historia.

Adams, J. N. (2003). Bilingualism and the Latin language. Cambridge: The press Syndicate of the University of Cambridge.

Albertos Firmat, M. L. (1966). La onomástica personal primitiva de Hispania: Tarraconense y Bética. Theses et studia philologica salmanticensia, 13. Salamanca: Consejo Superior de Investigaciones Científicas [etc.].

Aragão, M. P. F. (1895). Vizeu: apontamentos historicos. Tomo II. Viseu: Typographia Popular.

Beltrán Lloris, F. e Jordán Cólera, C. (2016). Celtibérico: lengua, escritura, epigrafia. AELAW Booklet, 1. Zaragoza: Prensas de la Universidad de Zaragoza.

Beltrán Lloris, F. e Jordán Cólera, C. (2019). “Writing and language in Celtiberia”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 240-303.

Berrocal, L. (1989). “El asentamiento céltico del Castrejón de Capote (Higuera la Real, Badajoz)”. Cuadernos de Prehistoria y Arqueología de la UAM, 16, pp. 245-295. DOI: https://doi.org/10.15366/cupauam1989.16.011

Berrocal, L. (2005). “The Celts of the Southwestern Iberian Peninsula”. e-Keltoi, 6, pp. 481-496.

Bishop, M. C. e Coulston, J. C. N. (2006). Roman Military Equipment: From the Punic Wars to the Fall of Rome. 2nd Edition. Oxford: Oxbow.

Calo Lourido, F. (2003). “Catálogo”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 6-32.

Carnoy, A. J. (1906). Le Latin d’Espagne d’après les inscriptions. 2ème ed. Bruxelles: Mish & Thron.

Carvalho, P. C., Carvalho, P. S. e Perpétuo, J. (2020). “A cidade romana de Viseu e os seus principais espaços públicos”. Revista Portuguesa de Arqueologia, 23, pp. 101-120.

Carvalho, P. C., Carvalho, P. S. e Perpétuo, J. (2022). “Vissaium, a cidade lusitana redescoberta”. Em: Nogales Basarrate, T. (Ed.). Ciudades Romanas de Hispania II / Cities of Roman Hispania II. Hispania Antigua, Serie Arqueológica, 14. Roma e Bristol: Museo Nacional de Arte Romano e L’erma di Bretschneider, pp. 393-412.

Carvalho, P. S. (2003). Trabalhos arqueológicos na Calçada da Vigia, nº 2, Viseu. Relatório policopiado.

Carvalho, P. S. e Costa, F. (2020). Trabalhos Arqueológicos (sondagens de diagnóstico arqueológico e acompanhamento arqueológico à picagem e/ou demolição de paramentos) no edifício situado no Gaveto Sr.ª da Boa Morte n.º 19/21 - Rua das Ameias nº 35/39, Viseu. Relatório policopiado.

Coelho, J. (1951). Caderno de Notas Arqueológicas nº 102 (25-03-1951 a 02-08-1951). s/l. Manuscrito.

Comércio do Porto, O. A. 3, nº 1 (2 jan. 1856) - [a. 152, nº 59 (30 jul. 2005)]. Porto: Typ. do Commercio.

Costa, F. (2016). Trabalhos arqueológicos (sondagens de diagnóstico arqueológico) no edifício da Rua Direita nº 149 (Antigo Orfeão), Santa Maria, Viseu. Relatório policopiado.

De Hoz, J. (1995). “Las sociedades celtibérica y lusitana y la escritura”. Archivo Español de Arqueología, 68, pp. 3-30. DOI: https://doi.org/10.3989/aespa.1995.v68.395

De Hoz, J. (2006). “Léxico paleohispánico referido al armamento y vestidura”. Palaeohispanica, 6, pp. 117-130.

De Hoz, J. (2013). “La epigrafía lusitana y la intersección de religión y lengua como marcador identitário”. Revista da Faculdade de Letras: Ciências e técnicas do Património,12, pp. 87-98.

De Palol, P. e Vilella, J. (1987). Clunia II: la epigrafía de Clunia. Madrid: Ministerio de Cultura (= ERClunia).

Denton, T. A (2019). Monumenta and Historiographical method in Livy’s Ab Vrbe Condita. Denver: University of Colorado (Phd dissertation).

Díaz-Guardamino Uribe, M. M. (2010). Las estelas decoradas en la Prehistoria de la Península Ibérica. Madrid: Universidad Complutense (tesis doctoral).

Diego Santos, F. (1986). Incripciones romanas de la provincia de León. León: Diputación Provincial de León (= IRPL).

Edmondson, J. (2002). “Writing Latin in the province of Lusitania”. Em: Cooley, A. E. (Ed.). Becoming Roman, Writing Latin? Literacy and Epigraphy in the Roman West. Portsmouth: Journal of Roman Archaeology, pp. 41-60.

Edmondson, J. (2006). Granite funerary stelae from Augusta Emerita. Monografías emeritenses 9. Mérida: Ministerio de Cultura.

Encarnação, J. d’ (1984). Inscrições romanas do conuentus Pacencis: subsídios para o estudo da romanização. Coimbra: [Universidade], Faculdade de Letras, Instituto de Arqueologia (= IRCP).

Estarán Tolosa, M. J. (2016). Epigrafía bilingüe del Occidente romano: el latín y las lenguas locales en las inscripciones bilingües y mixtas. Zaragoza: Prensas de la Universidad de Zaragoza.

Estarán Tolosa, M. J. (2019). “Deibabor igo deibobor Vissaieigobor: notas para el estudio de la retención lingüística en la epigrafía religiosa de la Lusitania romana”. Em: Tomás García, J. e Del Prete, V. (Eds.). Imágenes, lengua y creencias em Lusitania romana. Oxford: Archaeopress, pp. 54-72.

Esteban Ortega, J. (2012). Corpus de inscripciones latinas de Cáceres, II: Turgalium. Cáceres: Universidad de Extremadura (= CILCC II).

Estrabão (2016). Geografia, Livro III: introdução, tradução do grego e notas de J. Deserto e S. H. M. Pereira. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra.

Fernandes, L. S., Carvalho, P. S. e Figueira, N. (2008). “Uma nova ara votiva de Viseu (Beira Alta, Portugal)”. Sylloge Epigraphica Barcinonensis, 6, pp. 185-189.

Fernandes, L. S., Carvalho, P. S. e Figueira, N. (2009). “Divindades indígenas numa ara inédita de Viseu”. Palaeohispanica, 9 (= Acta Palaeohispanica X), pp. 143-155.

García-Gelabert Pérez, M. P. e Blázquez Martínez, J. M. (1994). “Estelas funerarias con retratos”. Em: De la Casa Martínez, C. (Coord.). Actas del V Congreso Internacional de Estelas Funerarias, Soria, 28 de abril al 1 de mayo de 1993, vol. 1, pp. 309-322.

Goldsworthy, A. (2003). The Complete Roman Army. London: Thames and Hudson.

Gorrochategui, J. e Vallejo, J. M. (2010). “Lengua y onomástica: las inscripciones lusitanas”. Em: Schattner, Th. e Santos, M. J. (Eds.). Porcom, Oilam, Taurom. Cabeço das Fráguas: o santuário no seu contexto. Iberografias, 6. Guarda: Centro de Estudos Ibéricos, pp. 71-80.

Gorrochategui, J. e Vallejo, J. M. (2015). “Langues fragmentaires et aires onomastiques : le cas de la Lusitanie et de l’Aquitaine”. Em: Dupraz, E. e Sowa, W. (Dir.). Genres épigraphiques et langues d’attestation fragmentaire dans l’espace méditerranéen. Rouen: Presses universitaires de Rouen et du Havre, pp. 337-356.

Jornal da Beira, propr. e dir. José d’Almeida. A. 1, n.º 1 (9 Jan. 1921). Viseu: Henrique Luis Ferreira.

Luján, E. R. (2019). “Language and writing among the Lusitanians”. Em: Sinner, A. G. e Velaza, J. (Eds.). Paleohispanic Languages and Epigraphies. Oxford: Oxford University Press, pp. 304-334.

Marco Simón, F. (1978). Las estelas decoradas de los conventos Caesaraugustano y Cluniense. Zaragoza: Institución “Fernando El Catolico” e Diputación Provincial de Zaragoza.

Mullen, A. (2012). “Introduction: multiples languages, multiples identities”. En: Mullen, A. e James, P. (Eds.). Multilingualism in the Graeco-Roman worlds. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 1-35.

Notícias de Viseu, A. 1, n.º 1 (5 Abr. 1919) a [a. 11 (10 ago. 1929)]. Viseu.

Palomar Lapesa, M. (1957). La onomástica personal pre-latina de la antigua Lusitania: estudio lingüístico. Theses et studia philologica salmanticensia, 10. Salamanca: Consejo Superior de Investigaciones Científicas [etc.].

Pokorny, J. (1959). Indogermanisches etymologisches Wörterbuch. Bern e München: Francke Verlag (= IEW).

Polito, E. (1997). “Trofeo e fregio d’armi”. Em: Enciclopedia dell’Arte Antica. Roma: Enciclopedia Italiana, pp. 852-862.

Portugal. Governo Civil do Distrito de Viseu (1894-1924). PT/SGMAI/GCVIS/H-B/001/02133: Sociedade de Recreio Protectora do Montepio Visiense, também designada de Sociedade de Recreio Protectora do Monte-Pio Viziense. Caixa 74 (cota original: K0718). Doc.

Prósper, B. M. (2008). “Lusitanian: A non-celtic Indo-European language of western Hispania”. Em: García Alonso, J. L. (Ed.). Celtic and other Languages in Ancient Europe. Salamanca: Ediciones Universidad de Salamanca, pp. 53-64.

Prósper, B. M. (2010a). “Cabeço das Fráguas y el sacrifício indoeuropeo”. Em: Schattner, Th. e Santos, M. J. (Eds.). Porcom, Oilam, Taurom. Cabeço das Fráguas: o Santuário no seu Contexto. Iberografias, 6. Guarda: Centro de Estudos Ibéricos, pp. 63-70.

Prósper, B. M. (2010b). “La lengua lusitana en el marco de las lenguas indoeuropeas occidentales y su relación con las lenguas itálicas”. Em: Carrasco, G. e Oliva, J. C. (Coords.). El Mediterráneo Antiguo: Lenguas y Escrituras. Cuenca: Universidad de Castilla-La Mancha, pp. 361-391.

Prósper, B. M. (2011). “The instrumental case in the thematic noun inflection of Continental Celtic”. Historische Sprachforschung / Historical Linguistics, 124, pp. 250-267. DOI: https://doi.org/10.13109/hisp.2011.124.1.250

Prósper, B. M. (2021). “The Lusitanian oblique cases revisited new light on the dative endings”. Em: González Iglesias, J. A., Méndez Dosuna, J. e Prósper, B. M. (Eds.). Curiositas nihil recusat: Studia Isabel Moreno Ferrero dicata. Salamanca: Universidad de Salamanca, pp. 427-442.

Prósper, B. M. (2022). “The sibilant sounds of Hispano-Celtic: phonetics, phonology and orthography”. Journal of Language Relationship, 20:1-2, pp. 1-24.

Quesada Sanz, F. (2002-2003). “Innovaciones de raíz helenística en el armamento y tácticas de los pueblos ibéricos desde el siglo III a. C.”. Cuadernos de Prehistoria y Arqueología de la UAM, 28-29, pp. 69-94. DOI: https://doi.org/10.15366/cupauam2003.29.005

Quesada Sanz, F. (2003). “¿Espejos de piedra?: las imágenes de armas en las estatuas de los guerreros llamados galaicos”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 87-112.

Redentor, A. (2019). “Os guerreiros lusitano-galaicos como representações de heróis”. Em: Schattner, Th. G. e Guerra, A. (Eds.). Das Antlitz der Götter: Götterbilder im Westen des Römischen Reiches / O rosto das divindades: imagens de divindades no ocidente do Império romano. Iberia Archaeologica, 20. Wiesbaden: Deutsches Archäologisches Institut e Reichert Verlag, pp. 133-149.

Ribeiro, J. C. (2014). “Damos-te esta ovelha, ó Trebopala!: a invocatio lusitana de Cabeço das Fráguas”. Conimbriga, 53, pp. 99-144.

Ribeiro, J. C. e Pires, H. (2021). “Da fixação textual das inscrições lusitanas de Lamas de Moledo, Cabeço das Fráguas e Arronches: o contributo do Modelo de Resíduo Morfológico (MRM), seus resultados e principais consequências interpretativas”. Palaeohispanica, 21, pp. 301-352.

Sá, A. (2007). Ciuitas Igaeditanorum: os deuses e os homens. Idanha-a-Nova: Município (= CIgaed)

Schattner, Th. G. (2003). “Stilistische und formale Beobachtungen an den Kriegerstatuen”. Madrider Mitteilungen, 44, pp. 127-146.

Schlüter, E. (1998). Hispanische Grabstelen der Kaiserzeit: Eine Studie zur Typologie, Ikonographie und Chronologi. Hamburger Beiträge zur Archäologie: Werkstadtreihe 2. Lüneburg: Camelion Verlag.

Silva, A. C. F. (2021). “O castro de Baiões e a organização gentílica da Beira Alta: de Baiões a Lafões”. Em: I Jornadas de Arqueologia Vouzela-Lafões: atas. Vouzela: Câmara Municipal, pp. 77-99.

Simón Cornago, I. (2017). “Los jinetes de las estelas de Clunia”. Palaeohispanica, 17 (= Acta Palaeohispanica XII), pp. 383-406.

Simón Cornago, I. (2019). “La paleografía y datación de la inscripción lusitana de Lamas de Moledo”. Mélanges de la Casa de Velázquez, 49:1, pp. 159-184. DOI: https://doi.org/10.4000/mcv.9762

Solin, H. (2003). Die griechischen Personennamen in Rom: ein Namenbuch. 2, völlig neu bearbeitete Auflage. Corpus Incriptionum Latinarum. Auctarium, Series Nova, 2. Berlin; New York: De Gruyter. 3 vol.

Väänänen, V. (1937). Le latin vulgaire des inscriptions pompéiennes. Helsinki: Société de Littérature Finnoise (Annales Academiae Scientiarum Fennicae; B XL, 2).

Vallejo, J. M. (2005). Antroponimia indígena de la Lusitania romana. Vitoria: Universidad del País Vasco.

Vallejo, J. M. (2009). “Viejas y nuevas cuestiones de lengua en el occidente peninsular: el lusitano y la onomástica”. Palaeohispanica, 9, pp. 271-289.

Vallejo, J. M. (2013). “Hacia uma definición del Lusitano”. Palaeohispanica, 13 (= Acta Palaeohispanica XI), pp. 273-291.

Vaz, J. L. I. (1997). A ciuitas de Viseu: espaço e sociedade. Coimbra: CCRC.

Vaz, J. L. I. (2009). “Génese e evolução de um espaço urbano: Viseu das origens à ocupação árabe”. Beira Alta, 68-69, pp. 147-201.

Vaz, J. L. I. e Carvalho, P. S. (2009). “Viseu, a construção de um espaço urbano: do castro proto-histórico à cidade romana”. Em: Cruz, J. (Coord.). Viseu: cidade de Afonso Henriques. Viseu: AVIS, pp. 31-46.

Villar, F. e Pedrero, R. (2001). “La nueva inscripción lusitana: Arroyo de la Luz III”. Em: Villar, F. e Fernández Álvarez, M. P. (Eds.). Religión, lengua y cultura prerromanas de Hispania: actas del VIII Coloquio de Lenguas y Culturas Paleohispánicas. Salamanca: Ediciones Universidad de Salamanca, pp. 663-698.

Wodtko, D. (2017). Lusitano: lengua, escritura, epigrafia. AELAW Booklet, 4. Zaragoza: Prensas de la Universida de Zaragoza.