Archivo Español de Arqueología 95
enero-diciembre 2022, e16
ISSN: 0066-6742, eISSN: 1988-3110, ISSN-L: 0066-6742
https://doi.org/10.3989/aespa.095.022.16

Taberna 2 de Mirobriga (Santiago do Cacém, Portugal): adaptações artesanais e domésticas e evolução ceramológica, nos séculos V e VI d. C.

Taberna 2 from Mirobriga (Santiago do Cacém, Portugal): artisanal and domestic adaptations and ceramic evolution, in the 5 th and 6 th centuries AD

José Carlos Quaresma

CHAM-Centro de Humanidades. NOVA/FCSH-Universidade Nova de Lisboa

https://orcid.org/0000-0003-3139-1975

RESUMO

Este artigo aborda duas grandes questões. A primeira é a evolução arquitectónica de um espaço comercial desde a Época Imperial até ao Período Visigótico, cronologia de cerca de cinco séculos ao longo do qual albergou funções comerciais, posteriormente artesanais e finalmente habitacionais. A segunda questão é a análise estratigráfica, tecnológica e estatística da cerâmica comum (local ou regional), em particular num período ainda pouco investigado estratigraficamente no território actualmente português - a primeira metade do século VI d. C. Esta linha de investigação segue outros trabalhos desenvolvidos em Mirobriga, aplicando-se propostas de datação por comparação estatística com os dados estratigráficos de outras áreas peninsulares, como Lisboa e Madrid.

Palavras-chave: 
evolução tecnológica da cerâmica comum; metalurgia; urbanismo tardo-antigo; Lusitania.
RESUMEN

Este articulo discute dos grandes cuestiones. La primera es la evolución arquitectónica de un espacio comercial desde la época imperial hasta el periodo visigótico, cronología de cerca de cinco siglos en los cuales ha tenido funciones comerciales, posteriormente artesanales y finalmente habitacionales. La segunda cuestión es el análisis estratigráfico, tecnológico y estadístico de la cerámica común (local o regional), en particular en un período aún poco investigado estratigráficamente en el territorio actualmente portugués: la primera mitad del siglo VI d. C. Esta línea de investigación sigue otros trabajos desarrollados en Mirobriga, aplicándose propuestas de datación por comparación estadística con los datos estratigráficos de otras áreas peninsulares, como Lisboa y Madrid.

Palabras clave: 
evolución tecnológica de la cerámica común; metalurgia; urbanismo tardo-antiguo; Lusitania.
ABSTRACT

This paper discusses two main questions. The first one relates to the architectonic evolution of a commercial building from the Imperial phase until the Visigothic one. Throughout these five centuries it has accomplished commercial, artisanal, and residential functions. The second question relates to the stratigraphic, technological, and statistical analysis of the coarse ware (local or regional), with particular stress on a barely investigated (in a stratigraphic base) period of the present-day Portuguese territory - the first half of the 6th century AD. This research line follows previous works undertaken at Mirobriga, by applying dating proposals through the statistical comparison with stratigraphic data from other peninsular areas, as Lisbon and Madrid.

Keywords: 
technological evolution of the coarse ware; metallurgy; Late-Antique urbanism; Lusitania.

Enviado: 21-10-2021. Aceptado: 04-03-2022. Publicado online: 21-09-2022

Cómo citar este artículo/Citation:  Quaresma, J. C. (2022). "Taberna 2 de Mirobriga (Santiago do Cacém, Portugal): adaptações artesanais e domésticas e evolução ceramológica, nos séculos V e VI d. C.". Archivo Español de Arqueología, 95, e16. https://doi.org/10.3989/aespa.095.022.16

CONTENIDO

1. INTRODUÇÃO

 

No seio do projecto de investigação TabMir, em curso desde 2016, com o apoio da Direcção Regional de Cultura do Alentejo, temos vindo a analisar, mediante escavação, a área comercial da cidade de Mirobriga, integrando essa análise no seio da própria interpretação urbanística da cidade romana e tardo-antiga como um todo. Por essa razão, para além de um artigo consagrado à taberna 1 (Quaresma et al., 2020cQuaresma, J. C., Silva, R. B., Guimarães, R., Sousa, F. e Felício, C. (2020c). “Taberna 1 from Mirobriga (Santiago do Cacém, Portugal): ceramic evolution of the Late Antique levels”. RCRF, 46 (31st Congress of the Rei Cretariae Romanae Fautores Marketing Roman pottery: economic relationships between local and imported product. Cluj-Napoca, Romania, 23rd-30th September 2018), pp. 97-103.), outros artigos foram dados à estampa - sobre a cidade (Quaresma et al., 2020bQuaresma, J. C., Felício, C., Sousa, F., Gadanho, A., Guimarães, R. e Silva, R. B. (2020b). “Mirobriga (Santiago do Cacém): novos desenvolvimentos científicos, entre análises e novas escavações”. Revista Portuguesa de Arqueologia, 23, pp. 121-130.), ou sobre as áreas domésticas (Quaresma et al., 2020aQuaresma, J. C., Felício, C., Sousa, F., Gadanho, A., Guimarães, R. e Silva, R. B. (2020a). “Espaços residenciais em Mirobriga (Santiago do Cacém, Portugal): leitura crítica de dois casos. Residential areas from Mirobriga (Santiago do Cacém, Portugal): critical perspective on two cases”. In: Pizzo, A. (Ed.). La arquitectura doméstica urbana de la Lusitania romana. MYTHRA 6. Mérida: Instituto de Arqueología de Mérida, pp. 195-207. ), para além da orientação científica de teses de mestrado sobre questões mirobriguenses (Sousa, 2018Sousa, F. (2018). A Casa da Calçada, Mirobriga. Diacronia de um Edifício Habitacional de Época Romana (Séculos I a IV d.C.). Dissertação de Mestrado em Arqueologia entregue à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Universidade Nova de Lisboa.; Felício, 2019Felício, C. (2019). Gestão de Resíduos em Mirobriga - O Sistema de Saneamento (Séculos I-IV d.C.). Dissertação de Mestrado em Arqueologia apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Universidade Nova de Lisboa.).

Mirobriga localiza-se na metade sul da provincia romana da Lusitania e resulta da transformação em cidade romana, entre o final da República e o período júlio-cláudio, de uma povoado indígena, céltico, fundado em meados do primeiro milénio a. C. Mirobiga é posteriormente integrada no território visigótico, a partir das rupturas políticas da primeira metade do século V d. C. (Leguay, 1993Leguay, J.-P. (1993). “O Portugal “Germânico”. In: Serrão, J. e Oliveira Marques (Eds.). Nova História de Portugal. II (Portugal das invasões germânicas à Reconquista). Lisboa: Editorial Presença, pp. 13-120.) (Fig. 1). É nesse âmbito multi-secular que decorre a existência da taberna 2, num edifício fundado em época flávia e no qual se integra a já referida taberna 1, onde foi ainda possível escavar níveis fundacionais flávios e um nível de ocupação do primeiro quartel do século VI, ambos assim coevos aos processos iniciais e finais da taberna 2, agora em apreço.

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Figura 1.  Localização de Mirobriga, na Hispania pós-romana (imagem do autor).

Se a escavação de Fernando de Almeida, nos anos de 1960 (Barata, 1997Barata, M. F. (1997). Miróbriga. Urbanismo e arquitectura, Tese de Mestrado apresentada na Faculdade de Letras. Universidade do Porto.), havia obliterado quase toda a estratigrafia da taberna 1, tal aconteceu com menor intensidade na taberna 2, onde pudemos realizar, na parte setentrional do compartimento, uma escavação em toda a diacronia estratigráfica, para além dos níveis fundacionais, na parte meridional. Este artigo é assim complementar ao referido trabalho sobre a taberna 1 (Quaresma et al., 2020cQuaresma, J. C., Silva, R. B., Guimarães, R., Sousa, F. e Felício, C. (2020c). “Taberna 1 from Mirobriga (Santiago do Cacém, Portugal): ceramic evolution of the Late Antique levels”. RCRF, 46 (31st Congress of the Rei Cretariae Romanae Fautores Marketing Roman pottery: economic relationships between local and imported product. Cluj-Napoca, Romania, 23rd-30th September 2018), pp. 97-103.), permitindo, todavia, uma análise muito mais segura e extensa, graças ao volume de base empírica estratigráfica conservada.

Tal como na taberna 1, foi possível atestar os seus níveis fundacionais flávios e uma ocupação do século VI d. C., de cariz muito provavelmente doméstico, que produz um palimpsesto dos níveis de ocupação imperial do compartimento. São duas as grandes novidades estratigráficas aportadas agora:

  • uma visão completa da instalação e abandono da ocupação de época visigótica;

  • e a detecção de algo inexistente na taberna 1: a adaptação do compartimento a actividades artesanais de cariz metalúrgico, provavelmente num século V pleno.

Este artigo consiste assim em três partes fundamentais: uma apresentação estratigráfica e arquitectónica do espaço e da sua diacronia imperial e tardo-antiga; uma discussão dos dados relativos à conversão da taberna em officina 1 Colocando este trabalho no campo da Arqueologia da Produção tardo-antiga, um campo iniciado há muito por R. Francovich (apudLa Salvia, 2016). Ver teorização mais recente em Giannicheda (2014) e em Duckworth e Wilson (2020). ; e uma discussão da evolução ceramológica, em particular da cerâmica comum local ou regional, em 500-525 e 525+ d. C. (ou seja, a par da discussão das evoluções arquitectónicas e funcionais detectadas neste ambiente, este artigo pretende discutir as consequências reflectidas na capacidade de elaboração da cerâmica comum destes grupos populacionais).

2. EVOLUÇÃO ARQUITECTÓNICA E CRONOLÓGICA DA TABERNA 2 DE MIROBRIGA

 

A taberna 2 é um espaço rectangular com dimensões semelhantes às da taberna 1, situada no mesmo edifício B, imediatamente a Oeste. Ambas são assim compartimentos de cerca de 8 metros de comprimento por cerca de 3,3 metros de largura, que possuem porta de entrada para a via VI, rua que ladeia meridionalmente o forum da cidade.

Com excepção do edifício E, uma domus ela própria com taberna integrada, denominada de Hospedaria por Fernando de Almeida (Almeida, 1964Almeida, F. (1964). Ruínas de Miróbriga dos Célticos (Santiago do Cacém). Setúbal: Junta Distrital de Setúbal.), esta rua parece basicamente dedicada ao comércio, contando com uma extensa fiada de tabernae (num mínimo de 10 possíveis de identificar ao momento), na sequência das tabernae 1 e 2. Em frente ao próprio edifício B, encontra-se actualmente em escavação, no seio do projecto TabMir, um edifício quadrangular cuja planta permite a sua classificação como macellum (Torrecilla Aznar, 2007Torrecilla Aznar, A. (2007). Los macella en la Hispania romana. estudio arquitectónico, funcional y simbólico. Tesis doctoral. Universidad Autónoma de Madrid.) (Fig. 2).

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Figura 2.  Planta de Mirobriga (imagem do autor a partir da cartografía das Ruínas Romanas de Mirobriga).

O edifício B possui, para além das tabernae 1 e 2, à cota da via VI, um compartimento junto ao seu tardoz, transversal às tabernae e próximo à cota do forum sobranceiro. A ligação deste compartimento com as lojas resta indefinido, não se percebendo sequer qualquer entrada independente para o mesmo. Este detalhe permite pensar que pudesse servir de apoio às tabernae 1 e 2 e que tivesse uma entrada interior através, por exemplo, de escada em madeira. Esta leitura é, contudo, especulativa, para além de pressupor uma propriedade integrada das duas lojas em apreço. Não há qualquer evidência de um segundo piso no seio das lojas propriamente ditas, tendo-se apenas detectado na taberna 1 um ligeiro degrau na rocha-mãe, que pode denunciar a colocação de uma divisória em madeira para um espaço de rectaguarda nos últimos 20 % de loja, mais próximos da parede de tardoz.

Tal como na taberna 1, a taberna 2 possui uma soleira segmentada, neste caso em 3 blocos: um, central, de pequena dimensão, e dois, laterais, de grandes dimensões (UUEE 1182, 1183 e 1184). Os dois primeiros, na parte mais ocidental, possuem sulco longitudinal de encaixe de batente, enquanto que o bloco mais oriental possui um orifício circular, na sua extremidade distal, para encaixe de gonzo de batente. Podemos assim aferir que a taberna 2 teria integrados dois sistemas de porta: um batente fixo, que seria amovível quando necessário, e um batente rotativo. Este facto faz divergir esta soleira da da taberna 1, onde parece apenas existir um sulco longitudinal para batente fixo amovível. Talvez assim se explique a presença de muro precário, justaposto no século VI d. C., para colmatação parcial em alvenaria, do vão de entrada da taberna 1 (Quaresma et al., 2020cQuaresma, J. C., Silva, R. B., Guimarães, R., Sousa, F. e Felício, C. (2020c). “Taberna 1 from Mirobriga (Santiago do Cacém, Portugal): ceramic evolution of the Late Antique levels”. RCRF, 46 (31st Congress of the Rei Cretariae Romanae Fautores Marketing Roman pottery: economic relationships between local and imported product. Cluj-Napoca, Romania, 23rd-30th September 2018), pp. 97-103.), um fenómeno recorrentemente identificado nos diversos sectores de tabernae em Mirobriga, enquanto que a taberna 2 não evidencia qualquer acção de colmatação parcial, em alvenaria, da entrada. Não é, contudo, de excluir que tal tenha existido e que possíveis vestígios ainda existentes no século XX possam ter sido obliterados nas campanhas de escavação que antecederam em muitas décadas o TabMir (Fig. 5A e 5M).

Quanto ao faseamento estratigráfico da taberna 2 (Fig. 3), a sua escavação permitiu a interpretação em 7 grandes fases, que decorrem desde a sua fundação, em época flávia, até às acções de corte e sedimentação decorrentes das campanhas de escavação de Fernando de Almeida, nos anos de 1960 e 1970.

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Figura 3.  Mirobriga. Diagrama estratigráfico da escavação da taberna 2 (elaboração do autor).

A Fase I (70-100 d. C.) encontra-se conservada no segmento junto à fachada da loja (Fig. 4) e respeita apenas a níveis de fundação do edifício. Para além da referida soleira de entrada (UUEE 1182, 1183 e 1184), toda a taberna (e, na verdade, todo o edifício, tal como comprovado anteriormente na taberna 1: Quaresma et al., 2020cQuaresma, J. C., Silva, R. B., Guimarães, R., Sousa, F. e Felício, C. (2020c). “Taberna 1 from Mirobriga (Santiago do Cacém, Portugal): ceramic evolution of the Late Antique levels”. RCRF, 46 (31st Congress of the Rei Cretariae Romanae Fautores Marketing Roman pottery: economic relationships between local and imported product. Cluj-Napoca, Romania, 23rd-30th September 2018), pp. 97-103.) será feita neste período, já que o embasamento [1181], rico em pedra miúda e média e nódulos de argamassa, lhe subjaz (Fig. 5I-M). Desta fase foi também possível determinar um largo corte no xisto de base (UE 1160), que chega a atingir cerca de 20 cm de profundidade, paralelo à fachada, que serviria de dreno das águas pluviais acumuladas no pavimento do edifício, implantado numa encosta que decai entre o tardoz e a fachada da loja, possuindo ainda a plataforma do forum a uma cota bem superior. Este sifão sem saída arquitectónica para a rua, escoa pela permeabilidade do embasamento e da rocha-mãe, tal como acontece no sifão semelhante da taberna 1. Os níveis de fundação da fachada poderão ainda ser alvo de escavação hipotética no futuro, no segmento que situa na via VI e que conjugam possivelmente a construção da taberna 2 com a pavimentação da própria rua (Fig. 5A).

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Figura 4.  Mirobriga. Planta final da taberna 2 (integrada no edifício B, onde se localiza igualmente a taberna 1), com escala métrica (quadrícula de implantação das coordenadas geográficas) (imagem do autor a partir da cartografía das Ruínas Romanas de Mirobriga).
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Figura 5.  Mirobriga (imagem do autor). A. Vista geral da taberna 2, antes do início da campanha de 2017 e tal como havia ficado no final da escavação de Fernando de Almeida, nos anos de 1960/1970. B. Fase VIb - segunda lareira, sem estruturação (UUEE 1049+1059), com pavimento lajeado (UE 1048). C. Fase VIa - primeira lareira, com estruturação (UE 1060) e nível de circulação em terra batida (UE 1064). D. Fase VIa - Vista de pormenor da primeira lareira, com estruturação (UE 1060). E. Fase II - alinhamento de buracos de poste, provavelmente de época imperial, junto à parede ocidental da taberna. F. Planta final da taberna 2, com a banquete não-escavada que conserva a lareira da fase VIa, e as cavidades das fases I (fundação), II (utilização imperial da taberna?) e III (adaptação artesanal, tardo-antiga, do espaço). G. Fase III - pormenor das cavidades para fim metalúrgico, UUEE 1174 (forno), 1178 (fossa de despejo) e 1173 (fossa de encaixe de bigorna) e UUEE 1176 e 1177 (buracos de poste de apoio a fole). H. Vista externa do embasamento da soleira da porta. I. Vista interna do embasamento da soleira da porta e respectiva parede de fachada. J. Vista externa do embasamento da soleira da porta. L. Pormenor da vista interna do embasamento da parede de fachada. M. Vista superior da soleira da porta.

Junto ao limite interior norte deste sifão (UE 1160) são visíveis dois orifícios da rocha-mãe: um no interior, amorfo, com 10 cm de profundidade (UE 1161); outro, no exterior, arredondado, de profundidade similar (UE 1162). Apesar deste último elemento interfacial ser preenchido pela [1102] da fase IVa (500-525 d. C.), pensamos pertencer ao processo de configuração inicial do compartimento, já que não descortinamos qualquer relação com os elementos interfaciais situados mais a Norte. Contudo, a sua função é-nos desconhecida. O elemento interfacial [1161] é preenchido pelo sedimento [1098] que preenche todo o grande sifão [1160].

Apesar de parca em materiais (Fig. 8), tal como acontece na fase estratigráfica de fundação da taberna 1, a Fase I da taberna 2 permite confirmar a cronologia flávia para o edifício B. No caso vertente, a terra sigillata hispânica com Drag. 15/17 e 27 de perfil simplificado e desenvolvido, a par da ausência de vasos itálicos e sudgálicos (neste caso, provavelmente casual), tal como dos congéneres africanos, permite-nos apontar para 70-100 d. C. Algo que as ânforas (nomeadamente a Dressel 14 lusitana), a cerâmica cinzenta, a cerâmica comum bética e cerâmica comum local ou regional não contradizem.

A Fase II, respeitante ao pouco que resta da vida imperial da taberna, pouco tem de conservado. Os materiais vão surgir em posição residual nas restantes fases do compartimento que analisaremos infra. Para esta fase de cerca de cinco séculos hipotéticos de vida apontamos apenas a existência de quatro cavidades alinhadas, junto à parede ocidental do compartimento e sensivelmente a meio do mesmo: os elementos interfaciais [1163], [1180], [1166] e [1169].

Os dois primeiros, estéreis, são preenchidos pela [1102] da Fase IVa: o orifício [1163] desenha um círculo regular, enquanto o orifício [1180] é muito pequeno e amorfo, mas estruturado com pedra e cerâmica de construção, tal como os dois restantes, que possuíam ligeiras diferenças nos sedimentos de enchimentos e que receberam assim identificação própria (UUEE 1167 e 1170). A extrema proximidade destas cavidades aos elementos interfaciais complexos que atribuímos à fase III leva-nos a excluir a sua pertença a esta fase tardia, por não restar qualquer funcionalidade nessa hipótese.

O único espólio recolhido nesta fase II (Fig. 9) foi um bordo de tegula de perfil triangular, tendencialmente datável entre os séculos I e III d. C. (Mills, 2013Mills, Ph. (2013). The ancient Mediterranean trade in ceramic building materials. A case study in Carthage and Beitute. Roman and Late Antique Mediterranean Pottery, 2. Oxford: Archaeopress. ). O enchimento [1170] continha um prego, enquanto que o enchimento [1167] continha espólio osteológico. A cronologia da Fase II é assim frágil e basicamente balizada entre o espectro temporal das Fases I e III.

A Fase III (Fig. 3) representa uma alteração profunda na funcionalidade do espaço ocupado na época imperial pela taberna 2. Esta função comercial perde-se na Antiguidade Tardia, num momento que atribuímos ao século V, embora, para já, com limitações empíricas. Sem sabermos se esta fase é precedida de abandono do espaço, sabemos seguramente que na Fase III são elaborados vários elementos interfaciais na rocha de base, na área central do compartimento (Fig. 4). A interpretação destas estruturas será discutida no próximo capítulo, mas a sua tipologia indica claramente uma utilização artesanal relacionada com a redução de cobre ou ferro e sobretudo a reciclagem de utensílios em metal. Ou seja, o compartimento deixa de ser uma taberna para se constituir como officina metalúrgica. Não há evidência material directa para a datação desta Fase III, já que os seus enchimentos são amortizações ocorridas na Fase IVa de 500-525 d. C. Também por esta razão, a cronologia da Fase III deverá assim estar muito próxima da da Fase IV, o que nos leva a excluir uma hipótese de cronologia inicial ainda em época tardo-romana.

A Fase IV (Fig. 3) representa o início de uma estratigrafia complexa, elaborada ao longo da primeira metade ou do primeiro terço do século VI d. C., e uma nova reconfiguração do espaço e da sua funcionalidade. Sem evidência completa, em face da ausência de lareira, parece-nos plausível pensar numa funcionalidade doméstica para o espaço outrora comercial e ainda recentemente artesanal. Esta proposta de função residencial é também influenciada pela sua confirmação na Fase VI, que lhe sucede rapidamente e que discutiremos infra.

Dividimos a Fase IV (500-525 d. C.) em três sub-fases, IVa, IVb e IVc. A Fase IVa consiste nos enchimentos de amortização (UUEE 1179, 1175, 1172, 1159 e 1165) das cavidades artesanais e buracos de poste, elaborados e usados na Fase III. As características destes enchimentos, nomeadamente do correspondente à [1175], que preenche a grande depressão [1174] e que o relaciona com o próprio uso artesanal do espaço, permite-nos concluir que não houve de facto qualquer período de abandono entre as Fases III e IV.

A Fase IVa consiste então na amortização dessas cavidades, agora sem utilidade, para além de constituírem o que parece ser um conjunto de mini-lixeiras rapidamente preenchidas, ao qual vai suceder em boa parte do espaço a UE 1102, composta por elementos pétreos heterogeneamente dispostos pelo ambiente. Esta unidade, que assenta directamente sobre o substrato geológico, foi interpretada como tratando-se de uma unidade de regularização, colmatando os desníveis existentes no terreno, de forma a facilitar a colocação de um piso de circulação.

Apesar da precaridade dessa preparação da Fase IVa, na Fase IVb (Fig. 3) surge então um piso de circulação, a [1106], correspondente a um sedimento argiloso bastante compacto interpretado como um pavimento em terra batida. O estabelecimento de uma possível correspondência entre as unidades [1088] e [1106] não é inequívoco. Ambas apresentam uma posição estratigráfica semelhante e características que permitem a sua interpretação como pavimentos de terra batida; no entanto, a UE 1088 apresenta inclusões de material de construção de dimensão superior aos identificados na [1106], bem como um aspecto bastante mais irregular. O compartimento, possivelmente em toda a sua extensão, terá recebido nesta fase um piso de circular bastante desnivelado e tosco, com uma pendente natural desde o tardoz até à fachada do edifício. A sua conservação não é, porém, completa, ou seja, as UUEE 1088 e 1106 não cobrem todo compartimento, o que interpretamos como decorrente de um problema de conservação tafonómica do espaço.

A Fase IVc (Fig. 3) consiste numa série de unidades negativas não muito seguras enquanto tal: as UUEE 1133, 1153, 1152 e 1151 poderão ser ligeiros recortes, mas uma mera deformação natural do topo da [1088] é porventura mais plausível. Sucede uma série de unidades positivas que poderão estar relacionadas com o uso do espaço, embora aparentemente em modo caótico, denotando profundo descuido na acumulação de detritos. Assim, a [1195=1132] consiste num sedimento argiloso, compacto, junto ao muro este do edifício, com uma grande concentração de carvão vegetal, alguns nódulos de argamassa e material de construção; apresenta um número considerável de fauna, material cerâmico e metálico. Sobrepõe-se-lhe a [1068], que consiste num sedimento com carvão vegetal, areno-argiloso, de consistência média, com concentrações de material pétreo constructivo e de lateres, sendo heterogéneo no que respeita às concentrações das últimas. Por fim, a [1103] consiste num sedimento areno-argiloso, de consistência média, rico em pedra pequena de alvenaria, e sobretudo argamassa, e pequenos fragmentos de cerâmica de construção.

O mobiliário da Fase IV é extenso, num total de 81 indivíduos e 323 fragmentos, sendo que cerca de metade corresponde a cerâmica comum local ou regional, que será debatida noutro capítulo (Fig. 10). Com uma taxa de residualidade de 29,6 %, possui um extenso repertório residual de cerâmicas finas de época imperial (terra sigillata, paredes finas, lucernas e campaniense). É possível que ainda se usem almofarizes nesta fase, embora a indefinição tipológica não permita concluir a sua contemporaneidade, que parece ainda ocorrer em Olisipo, nesta época (Quaresma, 2020Quaresma, J. C. (2020). “Late contexts from Olisipo (Lisbon, Portugal): Escadinhas de São Crispim”. In: Duggan, M., Turner, S. e Jackson, M. (Eds.). Ceramics and Atlantic Connections: Late Roman and early medieval imported pottery on the Atlantic Seaboard. International symposium. New Castle University, March 26-27th 2014. Roman and Late Antique Mediterranean Pottery, 15. Oxford: Archaeopress, pp. 94-107.). Nas ânforas, a Dressel 2-4 itálica é seguramente residual, mas já o espólio bético (litoral, Guadalquivir e Málaga), indeterminado, tal como a Almagro 51c da Lusitania ‒Tejo ou Sado- (Fig. 9, n.º 11) poderão ser coevos (veja-se por exemplo, a presença importante deste tipo lusitano, nos níveis de inícios do século VI d. C. do sector Sommer, em Olisipo: Pimenta e Fabião, no prelo). Na configuração cronológica desta fase IV destaca-se assim a tipologia dos vidros e em especial o tipo Isings 116/Taça campanulada baixa (Fig. 9, n.º 14), posicionada na UE 1095=1132, pertencente à Sub-Fase IVc, e cuja datação tipológica poderá rondar a segunda metade do século V e a primeira metade do século VI d. C. (Cruz, 2009Cruz, M. (2009). O Vidro Romano no Noroeste Peninsular. Um olhar a partir de Bracara Augusta. Tese de doutoramento. Universidade de Minho.). A cor clara do exemplar em apreço aponta também para uma cronologia que não alcance momentos avançados do século VI d. C. (Quaresma, Sarrazola e Silva, 2015Quaresma, J. C., Sarrazola, A. e Silva, I. M. (2015). “Produção de vidros e importação de terra sigilatta em finais do século V / primeira metade do século VI: o caso da Marinha Baixa, Aveiro”. Apontamentos, 10, pp. 63-76.).

A Fase V (Fig. 3) consiste num extenso derrube de telhado, em grande parte subtraído pela escavação das campanhas de Fernando de Almeida. A UE 1043 (Fig. 5C) é uma mancha de derrube, perto da área central do compartimento, que encontra assim a sua franja meridional numa outra estreita mancha encostada à entrada. A posição do derrube de telhado indica claramente que o claudicar das vigas de madeira de sustentação se processou no sentido da pendente da encosta onde se situa o edifício. O escasso mobiliário identificado não permite qualquer aferição cronológica, pelo que a datação desta fase é naturalmente balizada pelas fases que a antecedem e sucedem de forma imediata. Exactamente pela sua sobreposição imediata à estratigrafia da Fase IV, o derrube de telhado está datado de c. 525 d. C.

A fase VI (Fig. 3) é a mais complexa estratigraficamente e encontra-se dividida em três sub-fases, VIa, VIb e VIc. O compartimento apresenta agora evidências de uso doméstico, embora não se tenha detectado qualquer vestígio estratigráfico de buracos de poste para sustentação de cobertura. Também não se verificou qualquer evidência de mancha de derrube cerâmico de telhado. É muito possível assim que, colapsado o telhado da antiga taberna e officina que havia ainda perdurado pela Fase IV (residencial), os habitantes da Fase VI tenham recorrido a uma cobertura em matéria orgânica sustentada por um travejamento assente no topo das paredes laterais do edifício.

A Fase VIa consiste num primeiro nível de ocupação, claramente de função doméstica, em virtude da existência da lareira [1060], estrutura em cerâmica de construção romana reaproveitada, que encosta à parede norte. Com dimensões de 150 × 90 cm, consiste num rectângulo com rebordo ligeiro de contenção das cinzas de uso. Esta lareira assenta num sedimento que se denominou por UE 1064, um sedimento areno-argiloso, de consistência média/compacta, produzido por um sedimento com carvão vegetal e rara cerâmica de construção. Neste sentido colocamos a hipótese de ser o nível de circulação (com um desnivelamento altimétrico no sentido norte-sul de cerca de 10 cm) correspondente à instalação da lareira [1060]. Este possível nível de circulação pode, contudo, ser antes definido como nível de ocupação, já que não apresentava qualquer brilho de uso na sua superfície de topo, aspecto típico em níveis de circulação de terra batida (Fig. 5C-D). Por fim, a UE 1059 é um fino sedimento areno-argiloso, de consistência média, castanho-escuro cinza, assentando no pavimento da lareira [1060].

A Fase VIb (Fig. 3) consiste num segundo nível de ocupação do espaço, com a mesma função, mas com uma configuração técnica que diríamos inversa. Se na sub-fase anterior tínhamos uma lareira estruturada associada a um tosco pavimento em terra batida, agora encontramos um pavimento estruturado, associado a uma lareira não estruturada.

A UE 1049 assenta sobre a [1059] e consiste num fino sedimento areno-argiloso, de consistência média, cinzento, muito rico em carvão vegetal, no interior de elipse formada por pedras de alvenaria. Interpretamos como um nível de uso superior ao primeiro uso [1059] da lareira [1060]. O sedimento é semelhante ao do piso lajeado [1048], mas a intensidade do carvão é superior, conferindo uma tonalidade fortemente mais escura. O facto de a UE 1049 estar delimitada por um conjunto de pequenas pedras de alvenaria que produz uma elipse, forma claramente diversa à da lareira rectangular em cerâmica que lhe subjaz (UE 1060), pode significar que a UE 1048 seja, em conjunto com a UE 1049, uma fase de ocupação do espaço, posterior a uma fase de instalação da lareira (UE 1060) e seu uso inicial (UE 1059).

A UE 1048 é um sedimento areno-argiloso, de consistência média, castanho-escuro-cinza, rico em carvão vegetal, com bastante pedra de construção e lajes de calibre médio e grande. A UE 1048 é composta pelo referido sedimento e por um conjunto algo homogéneo de lajes fragmentadas depositadas de forma tendencialmente horizontal, o que prenuncia um nível de ocupação. Estas lajes serão muito provavelmente reutilizações de pavimentos da antiga cidade romana (Fig. 5B).

A estratigrafia tardo-antiga termina na Fase VIc (Fig. 3), formada por um conjunto de coluviões de abandono, UUEE 1046 e 1017, bastante ricas em material pétreo, sendo a segunda novamente composta por sedimento rico em carvão vegetal. As UUEE 1006 e 1007, junto à parede de tardoz do compartimento, com bastante pedra de calibre médio/grande e inclusões de argamassa, serão provavelmente evidência de colapso da parede, ainda na Antiguidade Tardia, indiciando uma degradação mais ou menos acelerada do topo dos muros e da cobertura perecível.

A Fase VI (Fig. 3) é a mais rica em mobiliário, com 109 indivíduos e 553 fragmentos. Apresenta igualmente um crescimento da taxa de residualidade, com 41,3 %. A cerâmica comum de origem local ou regional, volta a representar cerca de 50 %, tal como sucede na Fase IV. O espólio de cerâmica fina é todo ele residual (ver ainda assim um exemplar bem conservado de terra sigillata africana C/E, tipo Hayes 58A: Hayes, 1972Hayes, J. W. (1972). Late Roman pottery. London: The British School at Rome.) (Fig. 21, n.º 25). O mesmo parece acontecer no espólio anfórico, apesar de haver fragmentos indetermináveis lusitanos, béticos e africanos, hipoteticamente coevos. Novamente, a única informação seguramente coeva poderá respeitar aos vidros, onde surge novamente um exemplar de Isings 116/Taça campanulada baixa (Fig. 21, n.º 26), posicionada na UE 1017 da Fase VIc, e cuja datação tipológica poderá rondar, como dito supra, a segunda metade do século V e a primeira metade do século VI d. C. (Cruz, 2009Cruz, M. (2009). O Vidro Romano no Noroeste Peninsular. Um olhar a partir de Bracara Augusta. Tese de doutoramento. Universidade de Minho.). Novamente, a cor clara do vidro aponta para uma cronologia que não alcance momentos avançados do século VI d. C. (Quaresma, Sarrazola e Silva, 2015Quaresma, J. C., Sarrazola, A. e Silva, I. M. (2015). “Produção de vidros e importação de terra sigilatta em finais do século V / primeira metade do século VI: o caso da Marinha Baixa, Aveiro”. Apontamentos, 10, pp. 63-76.).

Por via da cronologia tipológica do exemplar vítreo, tal como pelo facto de a Fase VI se sobrepor de forma imediata ao derrube de telhado (Fase V), somos levados a propor que a Fase VI respeite a uma reocupação imediata do espaço, após o colapso do telhado cerâmico. Também pelas características morfológicas e tecnológicas da cerâmica comum local ou regional, por comparação com a da Fase IV, propomos assim uma cronologia de 525+ d. C. para a Fase VI.

A estratigrafia conservada na taberna 2 tem uma última fase respeitante às acções de escavação de Fernando de Almeida, nos anos de 1960, e consequente sedimentação até aos nossos dias. A Fase VII (Fig. 12) revela uma vala de reconhecimento prévio de muros, bastante usual nas escavações de Fernando de Almeida e ainda visível em vários sectores da cidade. A UE 1011 é assim um elemento interfacial produzido junto ao canto NE do compartimento (Fig. 5B-C), que já se encontrava preenchido pelas UUEE 1045 e 1010, aquando do início da escavação do TabMir, em 2016 (Fig. 5A). O seu espólio é assim quase totalmente residual, sendo apenas contemporâneo um indivíduo vítreo de garrafa de Sumol. O facto de esta vala [1011] cortar várias das unidades das Fases IV e VI confere-lhe, porém, algum espólio que será analisado infra.

3. INSTALAÇÃO DE OFICINA METALÚRGICA TARDO-ANTIGA NA TABERNA 2

 

A adaptação tardo-antiga de estruturas urbanas e rurais a processos artesanais de caracter metalúrgico está hoje bem definida nas suas linhas gerais, em espaços extra-lusitanos, e as cronologias deste processo possuem claramente o século V d. C. como centúria de massificação das adaptações dos espaços à nova funcionalidade. Parece ser, contudo, um fenómeno que se inicia sensivelmente na mesma altura das adaptações para outros fins industriais ou agrícolas que diversos espaços rurais apresentam na Hispania (Chavarria Arnau, 2007, p. 126Chavarría Arnau, A. (2007). El final de las ‘villae’ en ‘Hispania’ (siglos IV-VII D.C.). Bibliothèque de l’Antiquité Tardive, 7. Turnhout: Brepols.), ou seja, a partir da segunda metade do século IV d. C., cronologia conhecida, na Italia, para adaptações artesanais de fim metalúrgico, por exemplo em Mola di Monte Gelato - Roma (Castrorao Barba, 2018, p. 413Castrorao Barba, A. (2018). “Metalworking in the ‘Post-Classical’ phases of Roman villas in Italy (5th-7th centuries AD)”. Mélanges de l’École Française à Rome - Moyen Âge, 129 (2), pp. 411-425. DOI : https://doi.org/10.4000/mefrm.3692 ).

Ao longo do século V d. C., a consolidação deste processo adaptativo estende-se não só à Italia, mas a outras regiões do findo Império Romano do Ocidente. Na Hispania, o caso da villa de El Ruedo, na Baetica, está datado de 450+ d. C. (Chavarria Arnau, 2007, p. 128Chavarría Arnau, A. (2007). El final de las ‘villae’ en ‘Hispania’ (siglos IV-VII D.C.). Bibliothèque de l’Antiquité Tardive, 7. Turnhout: Brepols.); enquanto diversos espaços urbanos e rurais da Britannia iniciam o câmbio funcional após a segunda década do século V d. C.; e, na Gallia, a partir genericamente da mesma centúria (Castrorao Barba, 2018, pp. 411-413Castrorao Barba, A. (2018). “Metalworking in the ‘Post-Classical’ phases of Roman villas in Italy (5th-7th centuries AD)”. Mélanges de l’École Française à Rome - Moyen Âge, 129 (2), pp. 411-425. DOI : https://doi.org/10.4000/mefrm.3692 ).

Do ponto de vista antropológico, estas pequenas unidades produtivas metalúrgicas denunciam mudanças sociais, políticas e administrativas e poderão agora surgir inseridas em dinâmicas privadas, públicas ou mistas. Assim, na Gallia, a produção de metais parece ser tendencialmente dispersa, configurando-se em três modelos:

  • pequenas unidades especializadas na produção de ferro em bruto;

  • oficinas de redução agrupados no seio de grandes centros de produção de ferro em bruto;

  • oficinas que desenvolvem etapas diferentes do processo metalúrgico, inseridas em meio rural.

Já na Italia, o fenómeno encontra-se conhecido sobretudo em meio urbano, mas pode encontrar-se igualmente em comunidades rurais. Parece desenvolver-se em duas dinâmicas possíveis:

  • trabalho de metal relacionado com a construção de igrejas;

  • processos de reciclagem planificada (Castrorao Barba, 2018, pp. 412-413Castrorao Barba, A. (2018). “Metalworking in the ‘Post-Classical’ phases of Roman villas in Italy (5th-7th centuries AD)”. Mélanges de l’École Française à Rome - Moyen Âge, 129 (2), pp. 411-425. DOI : https://doi.org/10.4000/mefrm.3692 ).

A Britannia apresenta um quadro evolutivo diverso do espaço continental europeu ocidental, o qual atinge a própria Escandinávia. O quadro da reciclagem de materiais metálicos insulares foi já objecto de trabalhos de síntese, entre os quais se destacam os de Robin Fleming (2012Fleming, R. (2012). “Recycling in Britain after the Fall of Rome’s Metal Economy”. Past & Present, 217-1, pp. 3-45. DOI: https://doi.org/10.1093/pastj/gts027 ; 2021)Fleming, R. (2021). The material fall of Roman Britain, 300-525 CE. Filadelfia: University of Pennsylvania Press.. Num quadro epistemológico mais propenso às análises antropológicas e societais da Arqueologia Post-Processual, as mudanças na cultura material britânica, a partir do século V d. C., revelam também as novas dificuldades no acesso a metal virgem e na capacidade técnica do trabalho metalúrgico.

Assim, Fleming expões dois aspectos sociais cruciais, entre 350 e 600 d. C. (com a contracção do mundo urbano e productivo):

  • a progressão de uma sociedade altamente estratificada, com produção de excedentes, para uma outra, marcada pela subsistência agrícola;

  • a progressão para um controlo maior dos excedentes pela elites (Fleming, 2021, p. 119Fleming, R. (2021). The material fall of Roman Britain, 300-525 CE. Filadelfia: University of Pennsylvania Press.).

Para se ter uma ideia do decréscimo tecnológico e económico vivido na Antiguidade Tardia, estima-se que o Império Romano extraísse anualmente algo como 15000 toneladas de cobre, das quais cerca de 2250 toneladas teriam origem britânica. A produção de metal, nos séculos V, VI e VII, terá tido um peso equivalente a apenas 10 % do volume atingido em época romana (Fleming, 2021, pp. 120 e 125Fleming, R. (2021). The material fall of Roman Britain, 300-525 CE. Filadelfia: University of Pennsylvania Press.).

Ao nível da metalurgia, enquanto a Italia e a Gallia (tal como as áreas suíça e escandinava) mantêm, em maior grau, as suas redes de extracção, produção e troca, a Britannia parece recuar a um estágio mais letárgico: “temporarly industrial installations were regularly built in these centuries in abandoned masonry complexes across the western empire by specialist crews […]. No evidence, however, has been found for this kind of large-scale, organised recycling in fifth-century Britain”. A retoma de uma maior productividade metalúrgica insular parece acontecer apenas no final do século VI. A evidência empírica indica que, para o período entre os inícios do século V e os finais do século VI, a produção tenha sido escassa e realizada em fornos de tecnologia limitada, produzindo objectos de metal muito heterogéneo e rico em impurezas (Fleming, 2021, p. 122Fleming, R. (2021). The material fall of Roman Britain, 300-525 CE. Filadelfia: University of Pennsylvania Press.).

Na Britannia, esta quebra vivida entre os séculos V e VII parece atingir o ferro e o cobre, enquanto o chumbo parece manter a sua importância nas actividades de reciclagem. Os finais do século VI, período de retoma da reciclagem do cobre e do ferro, vão representar, ao invés, uma quebra no papel do chumbo britânico. Falamos de um processo estrutural, de longa-duração, tal como no continente, em que a recuperação será lenta. Ao nível do cobre, a informação recolhida na Britannia para os séculos V a VII aponta para uma total ausência de cobre virgem, havendo apenas reciclagem deste metal. Esta reciclagem de cobre, feita a partir da espoliação de sítio romanos, ter-se-á prolongado até ao próprio século VIII d. C. embora a extracção de ferro pareça ser novamente objeto de interesse sistemático a partir de finais do século VI d. C. (Fleming, 2021, pp. 130-134Fleming, R. (2021). The material fall of Roman Britain, 300-525 CE. Filadelfia: University of Pennsylvania Press.).

Já em Mirobriga, o enquadramento social das adaptações artesanais é difícil de elucidar. Se bem que seja conhecida muita escória de ferro ou cobre na área residencial de Mirobriga (Edifícios 1, 2 e 3: Fig. 2), falta ainda conhecer as áreas de fundição possíveis desse sector e qual o enquadramento dessas estruturas: públicas ou privadas. O Edifício 3 é seguramente uma domus (com taberna associada); o edifício 1 também uma domus, mas com possível fase artesanal no seu percurso (Quaresma et Al. 2020bQuaresma, J. C., Felício, C., Sousa, F., Gadanho, A., Guimarães, R. e Silva, R. B. (2020b). “Mirobriga (Santiago do Cacém): novos desenvolvimentos científicos, entre análises e novas escavações”. Revista Portuguesa de Arqueologia, 23, pp. 121-130.); mas o edifício 2 é de função desconhecida (Quaresma, 2012Quaresma, J. C. (2012). Economia antiga a partir de um centro de consumo lusitano. Terra sigillata e cerâmica africana de cozinha em Chãos Salgados (Mirobriga?). Estudos e Memórias, 4. Lisboa: UNIARQ.). A fase artesanal da antiga taberna 2 é assim impossível de enquadrar socialmente: pública ou privada. A investigação, datação e mapeamento destes fenómenos artesanais de pós-inícios do século V d. C. é ainda incipiente em Mirobriga e inexistente no território actualmente português.

A Fase III da taberna 2 (instalação de área artesanal) foi identificada através de uma série de elementos interfaciais realizados na rocha-mãe, sensivelmente a meio do compartimento. Se atentarmos na Fig. 4, podemos sistematizar três grupos de cavidades:

  • realçado por linha vermelha, um conjunto de 4 ou 5 cavidades circulares que facilmente podem ser interpretadas como buracos de poste não-estruturados (Fig. 5F). As UUEE 1171, 1168, 1164, 1158 e 1165 são de planta circular bastante bem feita, com excepção da [1164]. Por outro lado, o buraco de poste [1168], mais distante, coloca algumas dúvidas de pertencer a este sistema ou de ter sido resultado de uma qualquer adaptação ou erro de cálculo na sua implantação. Na verdade, embora esteja equidistante dos buracos de poste [1171] e [1164], provoca um efeito de elipse numa disposição geral que se aproximava do círculo imperfeito. O buraco de poste mais setentrional [1171], possui diâmetro de 23 cm e profundidade de 21 cm; o [1164] possui diâmetro de 30 cm e profundidade de 16 cm; o [1158] possui diâmetro de 20 cm e profundidade de 16 cm e o [1165] possui diâmetro de 20 cm e profundidade de 16 cm. O buraco de poste mais centrífugo, [1168] possui igualmente diâmetro de 20 cm, mas profundidade de apenas 8 cm. Este conjunto de buracos de poste são a base de uma cortina com postes de madeira de sustento de uma vedação em material perecível que protegeria o espaço de trabalho metalúrgico propriamente dito. A extrema proximidade dos buracos de poste da Fase II, que se dispõem em linha recta, serão assim necessariamente de um período anterior da vida do compartimento, como já abordado.

  • realçado também por linha vermelha, encontramos um outro alinhamento rectilíneo, constituído por dois buracos de poste não-estruturados, amorfos e de menores dimensões do que os da cortina de protecção (Fig. 5F-G). Este alinhamento recto (elementos interfaciais [1176] e [1177]) produz uma intersecção com a franja da grande cavidade [1174] e interpretamo-lo como a base de sustentação de um fole.

  • o conjunto artesanal possui um terceiro grupo de três cavidades, mas de grande dimensão (Fig. 5F-G). A principal será a [1174], que desenha um círculo quase perfeito, com diâmetro de 109-120 cm e profundidade de 60 cm; a sua interpretação funcional é de forno metalúrgico. A Oriente, a cavidade [1178] desenha um rectângulo mais pequeno, com 32 cm de profundidade máxima, que deverá ser uma fossa de despejo. A Ocidente, uma outra cavidade, [1173], desenha uma planta em crescente e possui profundidade mais ténue, desde 5 cm até 18 cm. Este valor escasso leva-nos a supor que seja o apoio para bigorna de trabalho do metal.

A interpretação deste conjunto de cavidades enquanto estrutura arquitectónica para o trabalho metalúrgico não se funda apenas na sua configuração. Como dissemos supra (ver também Fig. 3), os buracos de poste são preenchidos pelo sedimento da Fase IV, [1102], com excepção dos buracos de poste [1171] (preenchido pela [1172]) e [1158] (preenchido pela [1159]). A grande cavidade para forno [1174] é preenchida pela [1175], enquanto a cavidade para despejos (UE 1178) é preenchida pela [1179], mas a de apoio a bigorna (UE 1173) é novamente preenchida pelo sedimento da Fase IV, [1102].

Ao nível do espólio relacionado com a metalurgia, inventariou-se:

  • bastante escória na UE 1098 da Fase I, que pode indiciar alguma intrusibilidade tardo-antiga, também detectada na cerâmica comum. Também o enchimento [1175] do forno [1174] possui alguma escória.

  • algum carvão no enchimento [1159] do buraco de poste [1158].

  • material osteológico no enchimento [1172] do buraco de poste [1171], no enchimento [1179] da vala de despejo [1178] e no enchimento [1175] da vala de forno [1174] ‒ neste caso, por vezes com sinais de fogo intenso.

O sedimento [1175], que preenche o referido forno metalúrgico [1174], apresenta carvão, mas também por vezes tonalidades alaranjadas que se reflectem até ligeiramente nas paredes da cavidade (Fig. 5G). Este elemento é de crucial importância, pois comprova o uso desta cavidade como forno, onde se obtinham temperaturas mais ou menos elevadas que provocaram alguma rubefacção nas paredes da rocha-mãe, em xisto folheado, tal como em parte do sedimento de facies areno-argiloso de tonalidade castanha, que ganha então tonalidades alaranjadas, tal como as paredes do forno. Este fenómeno é bem conhecido noutros casos geográficos de estruturas simples de trabalho metalúrgico, onde, mediante a intensidade das temperaturas obtidas e/ou a extensão temporal da actividade artesanal, a dispersão da mancha e a sua homogeneidade podem atingir níveis elevados (Pektovic e Zivic, 2006, figs. 10-11Pektovic, S. e Zivic, M. (2006). “Traces of metallurgical activities in Late Roman Romuliana: results of recent investigations”. Metalurgija - Journal of Metallurgy, 12 (2-3), pp. 111-126.) (Fig. 7).

Classe Origem Grupo Tipo Frag. NMI NMI Prod. % NMI Prod.
Terra sigillata TSH-A D15/17 1 1 1 10
TSH-LR D27 1 1 1 10
Ânfora Lusitania, T/S D14 1 1 1 10
Baetica, litoral Ind. 1 1 1 10
Cerâmica Cinzenta Local ou Regional Ind. 1 1 1 10
Cerâmica Comum de Importação Baetica Jarro 1 1 1 10
Cerâmica Comum Local ou Regional Tampa 1 1 4 40
Ind. 8 3
Total 15 10 10 100
Residualidade: 0%
Intrusibilidade: 10%
Tabela 1.  Mirobriga. Taberna 2 - Fase I (70-100 d.C.): quantitativo do mobiliário (elaboração do autor).
Classe Origem Grupo Tipo Frag. NMI NMI Prod. % NMI Prod.
Cerâmica de construção Local ou regional Tegula-bordo triangular 1 1 1 1
Total 1 1 1 100
Residualidade: 0%
Intrusibilidade: 0%
Tabela 2.  Mirobriga. Taberna 2 - Fase II (sécs. I-V d.C.?): quantitativo do mobiliário (elaboração do autor).

A fossa [1173], interpretada como encaixe para bigorna, encontra paralelo morfológico em Roma, na Piazza Venezia, com cronologia coeva. Na Fig. 6, podemos atentar na fossa [1563], de perfil sinuoso, sem traços de combustão ou escória (Serlorenzi e Saguì, 2008, fig. 9Serlorenzi, M. e Saguì, L. (2008). “Roma, Piazza venezia. L’indagine archeologica per la realizzazione della metropolitana. Le fasi medievali e moderne”. Archeologia Medievale, 35, pp. 175-198.).

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Figura 6.  Paralelos de adaptações artesanais metalúrgicas numa taberna de Roma - sector de Piazza Venezia (adaptado de Serlorenzi e Saguì, 2008, fig. 9Serlorenzi, M. e Saguì, L. (2008). “Roma, Piazza venezia. L’indagine archeologica per la realizzazione della metropolitana. Le fasi medievali e moderne”. Archeologia Medievale, 35, pp. 175-198.).

A fossa [1178], interpretada para despejos, embora sem qualquer evidência de metal ou escória, forneceu, como dito, algum espólio osteológico no seu enchimento [1179]. Conhece-se casos em que as paredes das fossas com esta função se encontram endurecidas ou mesmo forradas com metal fundido que não foi recolhido com eficácia. Encontramos novamente paralelo no caso de Roma ‒ Piazza Venezia. Na Fig. 6, podemos atentar na fossa [1484], de perfil arredondado, com paredes totalmente cobertas pelo vazamento do metal fluidificado (Serlorenzi e Saguì, 2008, fig. 9Serlorenzi, M. e Saguì, L. (2008). “Roma, Piazza venezia. L’indagine archeologica per la realizzazione della metropolitana. Le fasi medievali e moderne”. Archeologia Medievale, 35, pp. 175-198.).

A escassez de evidência directa do trabalho metalúrgico, que se reduz à breve escória encontrada, deverá explicar-se pelo facto de esta Fase III não perdurar muito tempo, talvez centrada durante poucas décadas de um século V muito avançado, sendo amortizada directamente pela ocupação de 500-525 d. C. da Fase IV. Deveria ser um espaço constantemente limpo que forneceu assim pouco elementos do trabalho metalúrgico aí ocorrido e amortizado pela nova ocupação residencial.

A rubefacção ligeira das paredes do forno [1174], tal como a existência limitada de sedimento alaranjado no seu enchimento [1175], reforça a ideia de um uso do espaço, enquanto oficina metalúrgica, talvez limitado no tempo; tal como aponta para um uso mais ligado à reciclagem de objectos em metal do que para fundição de metal bruto. A inexistência de objectos completos ou parciais, tal como de pingos de fundição, concorre para a referida explicação de um uso das matérias-primas e de reciclagem dos utensílios metálicos, sempre realizado com enorme cuidado para evitar perdas, que se resumem à escassa escória já elencada.

A escória encontrada, sempre porosa e deformada, deverá pertencer ao tipo de “escória interna”, produzida no interior do forno e normalmente a mais dominante neste tipo de fundição (La Salvia, 2016, p. 258La Salvia, V. (2016). “Impianti metallurgico tardo antichi ed alto medievali a Roma. Alcune reflessioni technologiche e storico-economiche a partire dai ricenti rinvenimenti archeologici a Piazza della Madonna di Loreto”. In: Molinari, A., Valenzani, R. S. e Spera, L. (Eds.). L’Archeologia della produzione a Roma (secoli V-XV). Atti del Convegno Internazionale di Studi. Roma, 27-29 marzo 2014. Collection de l’École Française à Rome, 516, pp. 253-278.). Muito provavelmente trata-se de escória de cobre, a usualmente encontrada neste tipo de ambientes (a par do ferro ou do chumbo), embora só análises laboratoriais confirmem a sua classificação como cobre ou ferro. Em princípio, a fundição de ferro exigiria uma estrutura arquitectónica mais complexa e produziria uma rubefacção mais intensa dos sedimentos, como se verifica na Fig. 7, exemplificativa de caso da área balcânica (Pektovic e Zivic, 2006, fig. 10Pektovic, S. e Zivic, M. (2006). “Traces of metallurgical activities in Late Roman Romuliana: results of recent investigations”. Metalurgija - Journal of Metallurgy, 12 (2-3), pp. 111-126.).

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Figura 7.  Paralelos de adaptações artesanais metalúrgicas, com coloração alaranjada do sedimento depositado na área de forno, em consequência das temperaturas alcançada numa forja/fundição em Romuliana (Pektovic e Zivic, 2006, figs. 10-11Pektovic, S. e Zivic, M. (2006). “Traces of metallurgical activities in Late Roman Romuliana: results of recent investigations”. Metalurgija - Journal of Metallurgy, 12 (2-3), pp. 111-126.).

No seio do forno da Fase III foram encontrados dois seixos completamente alisados, provavelmente relacionados com o trabalho de reciclagem de material metálico, como acontece em outros casos publicados (por exemplo, Frazione San Cassiano: Castrorao Barba, 2018, p. 420Castrorao Barba, A. (2018). “Metalworking in the ‘Post-Classical’ phases of Roman villas in Italy (5th-7th centuries AD)”. Mélanges de l’École Française à Rome - Moyen Âge, 129 (2), pp. 411-425. DOI : https://doi.org/10.4000/mefrm.3692 ).

A classificação do forno de Mirobriga deve respeitar ao tipo bassuofuoco a pozzetto, embora de estilo muito simplificado. Esse tipo possui uma câmara montada em taipa, adobe ou alvenaria, com o mesmo diâmetro da fossa escavada no solo ou na rocha-mãe. A estrutura da câmara é normalmente apoiada por um conjunto exterior de postes que sustentam um anel em madeira fixado à parte superior da câmara, conferindo-lhe estabilidade. Esta arquitectura complexa não se verifica em Mirobriga. Aqui, não encontramos um círculo completo de buracos de poste, mas tão-só uma planta em arco; de igual modo, a rocha-mãe, na margem da cavidade, não apresenta qualquer vestígio de parede de forno, que naturalmente deixaria algum vestígio do cabouco e teria encaixe de fundação recortado na rocha (La Salvia, 2016, p. 255La Salvia, V. (2016). “Impianti metallurgico tardo antichi ed alto medievali a Roma. Alcune reflessioni technologiche e storico-economiche a partire dai ricenti rinvenimenti archeologici a Piazza della Madonna di Loreto”. In: Molinari, A., Valenzani, R. S. e Spera, L. (Eds.). L’Archeologia della produzione a Roma (secoli V-XV). Atti del Convegno Internazionale di Studi. Roma, 27-29 marzo 2014. Collection de l’École Française à Rome, 516, pp. 253-278.). A estrutura da Fase III deveria assim ser a de versão mais simples, possuindo apenas uma vala, provavelmente destinada muito mais à reciclagem de objectos do que à redução de metal; e, no caso da redução (comprovada por alguma escória já referida), deveria estar muito mais consagrada ao minério de cobre do que ao de ferro (o que só análises futuras da escória poderá esclarecer).

4. TABERNA 2 ‒ EVOLUÇÃO MORFOLÓGICA E TECNOLÓGICA DA CERÂMICA COMUM (LOCAL OU REGIONAL), EM ÉPOCA VISIGÓTICA (500-525 E 525+ D. C.)

 

As fases imperiais têm pouco a dizer no que respeita ao espólio de cerâmica comum: contêm naturalmente pouco material ‒ a primeira respeita a níveis de fundação e a segunda, relacionada com a ocupação imperial da taberna, está apenas representada por quatro buracos de poste.

Na Fase II, apenas se recolheu cerâmica de construção (ver comentário supra, no capítulo 1), enquanto que na Fase I, flávia, há sobretudo que registar a presença massiva dos fabricos 6a e 6b, oxidantes e de torno rápido, nos quais se engloba a única forma detectada, uma tampa. Destaca-se nesta fase, a presença intrusiva de um bojo do fabrico 10, em torno rápido, mas de cozedura semi-redutora, e que consideramos ser um elemento seguramente tardo-antigo, migrado da Fase IV para a UE 1098, aquando da preparação do espaço para uso residencial, tendo assim afectado ligeiramente níveis fundacionais muito mais antigos.

Para além de escassa e indeterminada cerâmica cinzenta, a Fase IV, datada de 500-525 d. C., é caracterizada por um algo diversificado leque de cerâmica comum local ou regional (Tab. 3). O uso do espaço, que classificamos de habitacional, anteriormente artesanal e comercial, produz assim um conjunto empírico compatível com tal funcionalidade.

Classe Origem Grupo Tipo Frag. NMI NMI Prod. % NMI Prod.
Terra sigillata Itálica Ind. 2 1 1 1,2
Sud-gálica Drag. 15/17 1 1 9 11,1
Drag. 18 5 3
Drag. 33 1 1
Tigela 4 4
Ind. 7
Hispânica-La Rioja Drag. 15/17 3 2 4 4,9
Drag. 24/25 1 1
Tigela 1 1
Ind. 2
Hispânica-Andújar Drag. 15/17 2 1 2 2,5
Prato 1 1
Ind. 3
Africana A Ind. 1 1 1 1,2
Africana C Hayes 50A/B 1 1 1 1,2
Ind. 1
Paredes finas Baetica? Ind. 1 1 1 1,2
Augusta Emerita Mayet 36 ou 37 2 2 2
Indeterminada Mayet 3 1 1 1 1,2
Ind. 7
Lucerna Baetica, litoral Disco 1 1 1 1,2
Ind. 1
Vidro Branco Ind. 1 1 5 6,2
Branco translúcido Ind. 1 1
Incolor esverdeado Is.116/Taça campanulada baixa 1 1
Vidraça 2 1
Verde médio Is.116=Taça campanulada 1 1
Incolor Ind. 8
Campaniense Ind. 2 1 1 1,2
Almofariz Local ou regional Ind. 1 1 1 1,2
Ânfora Italia, Tirreno Dressel 2-4 1 1 1 1,2
Ind. 2
Baetica, Guadalquivir Ind. 1 1 1 1,2
Baetica, litoral Ind. 5 1 1 1,2
Baetica, Málaga Ind. 3 1 1 1,2
Lusitania, Tejo/Sado Almagro 51c 1 1 1 1,2
Ind. 10
Cerâmica comum de importação Baetica Jarro? 1 1 1 1,2
Baetica, litoral Taça de aba 1 1 2 2,5
Jarro 1 1
Indeterminada Ind. 7 1 1 1,2
Cerâmica cinzenta Local ou Regional Ind. 1 1 1 1,2
Cerâmica comum Local ou Regional Panela de bordo em S 38 5 40 49,4
Panela de bordo amendoado 2 2
Panela de bordo vertical 4 4
Tacho 3 3
Pote de bordo em S 14 7
Pote de bordo amendoado 1 1
Pote de bordo espessado 1 1
Pote de bordo vertical 2 2
Prato covo 4 3
Tigela 5 5
Tampa 5 4
Jarro 1 1
Cerâmica comum Cossoiro 1 1
Local ou Regional Dolium 1 1
Ind. 140
Cerâmica de construção Local ou regional Imbrex 1 1 1 1,2
Total 323 81 81 100
Residualidade: 29,6%
Intrusibilidade: 0%
Tabela 3.  Mirobriga. Taberna 2 - Fase IV (500-525 d.C.): quantitativo do mobiliário (elaboração do autor).
Classe Origem Grupo Tipo Frag. NMI NMI Prod. % NMI Prod.
Ânfora Lusitania, T/S Dressel 14c 1 1 1 20
Baetica, litoral Beltrán II? 1 1 1 20
Cerâmica Comum de Importação Ind. Ind. 2 1 1 20
Cerâmica Comum Local ou Regional Ind. 6 2 2 40
Total 10 5 5 100
Residualidade: 40%
Intrusibilidade: 0%
Tabela 4.  Mirobriga. Taberna 2 - Fase V (c.525 d.C.): quantitativo do mobiliário (elaboração do autor).

Os 40 indivíduos desta categoria cerâmica dão um claro relevo às funções de mesa e de cozinha, às quais podemos ainda acrescentar a função de armazenagem. Fica também evidente que o consumo e armazenagem de alimentos sólidos é largamente superior, ou pelo menos alvo de muito maior atenção, ao de alimentos líquidos. Assim, encontramos apenas um jarro (que se junta a outros dois de origem bética, onde encontramos ainda uma tigela) e um dolium, também ele de pequenas dimensões e morfologia semelhante ao que poderíamos também chamar de grande pote de bordo em S (Fig. 9, n.º 15). O trabalho doméstico é ainda representado por um cossoiro de perfil semi-trapezoidal, que se encontra no enchimento de amortização do forno da Fase III (Fig. 8, n.º 1).

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Figura 8.  Mirobriga. Taberna 2 - Mobiliário de 500-525 d.C. (Fase IV) (elaboração do autor).

Na cozinha, o conjunto é então dominado pelas panelas, com 11 indivíduos, seguidas por uma minoria de 3 tachos, sempre de perfil alto, mas com variações no perfil de bordo (Fig. 9, n.º 8 e 19). Também as panelas se encontram sistematizadas num total de 3 variantes de bordo: de perfil em S (Fig. 9, n.º 13), dominante; de bordo vertical, muito bem representada (Fig. 9, n.º 12 e 18); e de bordo em amêndoa, estatisticamente secundária (Fig. 9, n.º 16 e 17).

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Figura 9.  Mirobriga. Taberna 2 - Mobiliário de 500-525 d.C. (Fase IV) (elaboração do autor).

Uma categoria tão bem representada quanto as panelas, também com 11 indivíduos, é a dos potes (cuja classificação, convém sempre lembrar, poderá ser a de panela, na falta de traços preservados de fogo no segmento preservado). Para este tipo encontrou-se um total de 4 variantes: de bordo em S, dominante (Fig. 8, n.º 2, 4, 21); de bordo vertical (Fig. 8, n.º 5, 6), amendoado (Fig. 9, n.º 10, 20) ou espessado (Fig. 9, n.º 9), estas três claramente secundárias.

A tampa é uma categoria funcional que se pode adaptar tanto à cozinha, como à mesa ou à armazenagem: os quatro indivíduos podem pertencer assim hipoteticamente a potes ou panelas. A mesa propriamente dita encontra-se igualmente bem representada, num total de 9 indivíduos, repartidos pelo jarro, já referido, pelos pratos covos e sobretudo pelas tigelas. O n.º 7 (Fig. 9) é um prato covo de 200mm de diâmetro, de bordo simples arredondado e perfil de corpo que o aproxima bastante de uma tigela de grandes dimensões.

Do ponto de vista estratigráfico, o enchimento de amortização [1175] do forno [1174], apresenta, para além do referido cossoiro, um conjunto de potes que se distribuem pelo bordo de perfil em S (Fig. 8, n.º 2 e 4) e pelo bordo vertical, simples ou com espessamento externo, mas sempre com colo côncavo, que produz uma natural extroversão do bordo. Este sub-tipo de bordo vertical apresenta características singulares nesta fase estratigráfica: para além do bordo vertical desenvolvido e côncavo, um ombro marcado por carena ligeira e banda estreita, saliente ou não, de decoração incisa com linhas oblíquas (Fig. 8, n.º 5 e 6). As paredes, altas, insinuando um corpo estreito, possuem um bom alisamento e o fabrico é sempre o 3b, de facies muscovítico, em torno lento e cozedura semi-redutora. O único fundo de pote conservado, é plano, mas pertence ao fabrico 10 (Fig. 8, n.º 3).

As restantes unidades da Fase IV (Fig. 9) não revelam diferenças significativas na composição do mobiliário, sendo perceptível a continuidade, por exemplo, de panelas e tachos, nas diversas variantes. Deste conjunto, podemos destacar um exemplar de panela de bordo vertical e corpo grácil. O n.º 12 (Fig. 9) encontra outro indivíduo na mesma UE 1095 e outro ainda na UE 1068, sendo possível, mas não confirmável, que pertençam ao mesmo indivíduo, pelo que só podemos aceitar que possam ser diferentes exemplares realizados com técnica muito repetitiva de boa qualidade: excelente alisamento da parede muito delgada e fabrico 9, de facies quatzítico, em torno lento e cozedura redutora.

O colapso do telhado da taberna 2 pouca informação fornece sobre a evolução da cerâmica comum, na qual apenas consta o fabrico 6a, de facies quartzítico, torno rápido e cozedura oxidante, mas com formas indetermináveis, tal como a cerâmica comum de importação com origem bética. Mas sobre a distribuição cronológica e funcional dos fabricos da cerâmica comum, local ou regional, falaremos infra.

A Fase VI está datada de 525+ d. C., em parte pela linha de continuidade morfológica do espólio de cerâmica comum local ou regional, que não parece sofrer evoluções significativas, por comparação com o primeiro quartel do século VI d. C. A colecção apresenta uma diversidade qualitativamente semelhante, por comparação com a Fase IV (Tab. 5).

Classe Origem Grupo Tipo Frag. NMI NMI Prod. % NMI Prod. Obs.
Terra sigillata Itálica Ind. 2 1 1 0,9
Sud-gálica Drag. 18 2 2 6 5,5
Drag. 27 3 2
Drag. 35 1 1
Decorada 1 1
Ind. 7
Hispânica-La Rioja Drag. 18 1 1 3 2,8
Drag. 27 1 1
Tigela 1 1
Ind. 7
Hispânica-Andújar Drag. 15/17 4 2 4 3,7
Prato 1 1
Decorada 1 1
Ind. 5
Hispânica? Ind. 1 1 1 0,9
Africana A Hayes 3A, aba larga 1 1 3 2,8
Hayes 15 precoce 1 1
Forma fechada 1 1
Ind. 5
Africana C Hayes 50 9 9 9 8,3
Ind. 19
Africana C/E Hayes 58A 1 1 1 0,9
IEV Indeterminada Patina cinzenta Hayes 14A 2 2 2
Paredes finas Local ou regional Ind. 3 1 1 0,9
Hispania, SW Ind. 1 1 1 0,9
Indeterminada Mayet 3? 1 1 1 0,9
Ind. 1
Lucerna Baetica, litoral Volutas 1 1 2 1,8
Disco 1 1
Italia Volutas 1 1 1 0,9
Indeterminada Volutas 1 1 1 0,9
Vidro Verde claro Vidraça 1 1 3 2,8
Incolor esverdeado Ar 14 1 1
Is.116/Taça campanulada baixa 1 1
Campaniense Prato 1 1 2 1,8
Ind. 1 1
Engobe vermelho pompeiano Campania Ind. 1 1 1 0,9
Ânfora Africa Ind. 1 1 1 0,9
Africa, Zeugitana Nabeul Ind. 1 1 1 0,9
Baetica, Guadalquivir Dressel 20 1 1 1 0,9
Ind. 4
Baetica, litoral Ind. 8 1 1 0,9
Italia, Tirreno Dressel 1 1 1 1 0,9
Ind. 1
Lusitania, Ind. Ovóide Lusitana? 1 1 1 0,9
Lusitania, T/S Dressel 14 1 1 1 0,9
Ind. 9
Cerâmica comum de importação Baetica, litoral Tigela 1 1 2 1,8
Pote 1 1
Ind. 3
Indeterminada Tigela 1 1 2 1,8
Jarro 1 1
Ind. 1
Cerâmica cinzenta Local ou Regional Tampa 1 1 1 0,9
Cerâmica comum Local ou Regional Panela de bordo em S 83 13 54 49,5
Panela de bordo amendoado 1 1
Tacho 5 3
Tacho? 1 1
Pote de bordo em S 38 11
Pote de bordo amendoado 4 4
Pote de bordo espessado 1 1
Pote ou Jarro 1 1
Potinho 2 2
Prato covo/Frigideira 1 1 Importação?
Taça de aba 1 1 Forma grácil, fina. Aba canelada
Tigela 11 7
Tigela III B1a (Pinto, 2003) 1 1
Tampa 4 4
Jarro 2 2
Dolium 5 1
Ind. 262
Total 553 109 109 100
Residualidade: 41,3%
Intrusibilidade: 0%
Tabela 5.  Mirobriga. Taberna 2 - Fase VI (525+ d.C.): quantitativo do mobiliário (elaboração do autor).

Na cozinha, mantém-se o domínio da panela sobre o tacho, numa proporção semelhante, agora de 14 e 4 indivíduos, respectivamente. Reduz-se a diversidade morfológica no seio das panelas, como bordo em S e amendoado, mas desaparecendo a variante vertical. Os tachos reduzem-se agora ao perfil de bordo dobrado horizontal simples (Fig. 11, n.º 32). Nas panelas, observava-se agora um domínio esmagador do bordo em S, com 13 indivíduos (Figs. 10 e 11, n.º 22, 23, 33, 35 e 36), estando o bordo amendoado restringido a um único indivíduo (Fig. 10, n.º 24). O bordo em S pode apresentar biselamento suave (Fig. 11, n.º 33 e 36), ou bem marcado (Figs. 10 e 11, n.º 22, 23 e 35). Neste último caso, os corpos, conservados, apresentam perfil equilibrado, ligeiramente alto, com fundo plano.

Classe Origem Grupo Tipo Frag. NMI NMI Prod. % NMI Prod.
Terra sigillata Sud-gálica Drag. 18 1 1 7 17,9
Drag. 24/25 3 3
Drag. 27 1 1
Tigela 2 2
Ind. 4
Hispânica-La Rioja Ind. 1 1 1 2,6
Hispânica-Andújar Prato 1 1 1 2,6
Africana C Ind. 5 1 1 2,6
Paredes finas Local ou regional Mayet 3? 1 1 1 2,6
Lucerrna Indeterminada 1 1 1 2,6
Rio Tinto/Aljustrel Lucerna mineira - Dressel 9 1 1 1 2,6
Ânfora Italia, Tirreno Ind. 1 1 1 2,6
Baetica, Guadalquivir Ind. 1 1 1 2,6
Baetica, litoral Ind. 4 1 1 2,6
Vidro Sumol 1 1 3 7,7
Verde claro Ind. 1 1
Incolor esverdeado Is.116/Taça campanulada 1 1
Cerâmica comum de importação Indeterminada Jarro 1 1 1
Cerâmica comum Local ou regional Panela de bordo em S 11 5 19 48,7
Pote de bordo em S 3 3
Tacho 3 2
Prato covo 1 1
Taça 1 1
Tigela 5 5
Tampa 1 1
Jarro 2 1
Ind. 64
Total 122 39 39 100
Residualidade: 97,4%
Intrusibilidade: 0%
Tabela 6.  Mirobriga. Taberna 2 - Fase VII (1960+ d.C.): quantitativo do mobiliário (elaboração do autor).
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Figura 10.  Mirobriga. Taberna 2 - Mobiliário de 525+ d.C. (Fase VI) (elaboração do autor).

Os potes aumentam o seu peso no conjunto cerâmico, com um total de 16 indivíduos, claramente dominados pelo sub-tipo de bordo em S, seguido à distância pelas variantes de bordo amendoado (Fig. 11, n.º 29, 30 e 38) e espessado (Fig. 11, n.º 31), desaparecendo o bordo vertical, tal como acontece nas panelas. Surge, porém, uma nova variante, a do potinho ‒ com bordo simples, esvertido, sem colo e com simples inflexão acentuada que o une ao corpo tendencialmente esférico (Fig. 11, n.º 27) ‒ e que acresce 2 indivíduos aos 16 potes.

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Figura 11.  Mirobriga. Taberna 2 - Mobiliário de 525+ d.C. (Fase VI) (elaboração do autor).

O prato covo (neste caso, com dúvidas de classificação para frigideira) parece diminuir de peso no conjunto, agora com um único indivíduo (com excelente fabrico, parede algo recta, esvertida, e bordo simples, não excluímos de se tratar de uma importação: Fig. 11, n.º 37), enquanto as tigelas mantêm um papel relevante, com 8 indivíduos (Fig. 11, n.º 34).

As tampas, de aplicação indefinida, mantêm-se presentes e podem incluir a decoração penteada no topo (Fig. 11, n.º 28). O mesmo comportamento parece ocorrer na contenção de líquidos, onde jarros e dolia parecem igualmente manter o mesmo peso no conjunto.

Por fim, a Fase VII, de Época Contemporânea, mas que oblitera várias UUEE tardo-antigas, acaba por incluir um espólio ainda considerável de cerâmica comum, local ou regional, em boa parte devido às acções provocadas pelas campanhas de Fernando de Almeida, através da vala [1011] e respectivos enchimentos [1045] e [1010], aos quais ainda acresce o papel da circulação de pessoas, nas últimas décadas de vida do sítio arqueológico, que se conformam no coluvião [1003], que preenche ligeiramente o largo elemento interfacial [1014], produzido pela escavação da parte meridional da taberna, igualmente no decorrer das campanhas de Fernando de Almeida.

Nesta fase de reembalamento de material romano e tardo-antigo (Fig. 12), voltamos a observar a presença do vidro Isings 116/Taça campanulada e de uma parte do repertório conhecido de cerâmica comum local ou regional.

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Figura 12.  Mirobriga. Taberna 2 - Mobiliário residual de 1960+ d.C. (Fase VII) (elaboração do autor).

Do ponto de vista arqueométrico, estabelecemos, na cerâmica comum local ou regional, um total de 18 fabricos (6 deles, enquanto variantes), que se podem agrupar nos seguintes grandes facies (Tab. 7):

  • geológico: caulinítico (1 e 2), muscovítico (3a, 3b, 3c, 4, 5 e 13), quartzo-micácico (14) e quartzítico (6a, 6b, 6c, 7, 8, 9, 10, 11 e 12);

  • modelagem: torno rápido (1, 2, 4, 5, 6a, 6b, 6c, 8, 11 e 12), torno lento (3a, 3b, 3c, 7, 9, 10 e 14), manual (13);

  • cozedura: oxidante (1, 2, 3c, 4, 5, 6a, 6b, 6c e 7), redutora (3a, 8, 9 e 12), e semi-redutora (3b, 10, 11, 13 e 14).

Fabrico Matriz Descrição
1 Caulinítico branco - TR - Ox medium/medium-AESPA-95-e16-i013.png Pasta algo compacta, de grão médio, com muitos vácuos pequenos, sub-angulosos. ENP bem distribuídos, de pequena dimensão: bastante quartzo hialino, sub-arredondado; raro feldspato, em tons médios, subanguloso.
2 Caulinítico rosa - TR - Ox medium/medium-AESPA-95-e16-i014.png Pasta compacta, de grão médio, com muitos vácuos pequenos, sub-angulosos. ENP bem distribuídos, de pequena dimensão: bastante quartzo hialino, sub-arredondado; raro feldspato, em tons médios, subanguloso; escassas inclusões ferruginosas de ínfima dimensão; escassa biotite de ínfima dimensão.
3a Muscovítico grosseiro - TL - R medium/medium-AESPA-95-e16-i015.png Pasta pouco compacta, de grão médio, com bastante vácuos pequenos, sub-angulosos e raros vácuos alongados. ENP bem distribuídos, de pequena e média dimensão: quartzo hialino, sub-anguloso; raro quartzo leitoso, sub-anguloso; alguma muscovite de ínfima dimensão; raros fragmentos de xisto folheado (?). Raros casos contém biotite de pequena dimensão, distribuída à superfície.
3b Muscovítico grosseiro - TL - SemiRed medium/medium-AESPA-95-e16-i016.png Pasta pouco compacta, de grão médio, com bastante vácuos pequenos, sub-angulosos e raros vácuos alongados. ENP bem distribuídos, de pequena e média dimensão: quartzo hialino, sub-anguloso; raro quartzo leitoso, sub-anguloso; alguma muscovite de ínfima dimensão; raros fragmentos de xisto folheado (?).
3c Muscovítico grosseiro - TL - Ox medium/medium-AESPA-95-e16-i017.png Pasta pouco compacta, de grão médio/fino, com bastante vácuos pequenos, sub-angulosos e raros vácuos alongados. ENP bem distribuídos, de pequena e média dimensão: quartzo hialino, sub-anguloso; raro quartzo leitoso, sub-anguloso; rara muscovite de ínfima dimensão; raros fragmentos de xisto folheado (?). Raros casos contém biotite de pequena dimensão, distribuída à superfície.
4 Muscovítico grosseiro - TR - Ox medium/medium-AESPA-95-e16-i018.png Pasta algo granulosa, de grão médio, com bastante vácuos pequenos, sub-angulosos, ou alongados. ENP bem distribuídos, de pequena e média dimensão: muito quartzo hialino e leitoso, sub-anguloso; rara chamota branca e castanho-avermelhada; raros fragmentos de xisto folheado (?); rara muscovite de ínfima dimensão.
5 Muscovítico fino - TR - Ox medium/medium-AESPA-95-e16-i019.png Pasta pouco compacta, de grão médio, com bastante vácuos pequenos, sub-angulosos e alongados. ENP bem distribuídos, de pequena dimensão: quartzo hialino, sub-anguloso, bem distribuído; alguma chamota castanho-avermelhada, por vezes de média dimensão; alguma muscovite, bem distribuída, muito fina; raros ENP máficos negros, sem brilho.
6a Quartzítico - TR - Ox medium/medium-AESPA-95-e16-i020.png Pasta pouco compacta, de grão médio, com bastante vácuos pequenos, sub-angulosos. ENP, bem distribuídos, de pequena dimensão: quartzo hialino, sub-anguloso; escassa chamota castanho-avermelhada e quartzo hialino de média/grande dimensão. Rara muscovite, finíssima.
6b Quartzítico - TR - Ox medium/medium-AESPA-95-e16-i021.png Pasta pouco compacta, de grão médio/fino, com bastante vácuos pequenos, sub-angulosos. ENP bem distribuídos, de pequena dimensão: quartzo hialino, sub-anguloso; escassa chamota castanho-avermelhada e quartzo hialino de média/grande dimensão. Rara muscovite, finíssima.
6c Quartzítico - TR - Ox medium/medium-AESPA-95-e16-i022.png Pasta pouco compacta, de grão médio, com bastante vácuos pequenos, sub-angulosos. ENP bem distribuídos, de pequena dimensão: quartzo hialino, sub-anguloso; escassa chamota castanho-avermelhada e quartzo hialino de média/grande dimensão. Rara muscovite, finíssima. Muitos ENP cinzas (quartzo hialino de pequeno/médio tamanho).
7 Quartzítico - TL - Ox medium/medium-AESPA-95-e16-i023.png Pasta pouco compacta, de grão médio, com bastante vácuos pequenos, sub-angulosos. ENP bem distribuídos, de pequena dimensão: quartzo hialino, sub-anguloso; escassa chamota castanho-avermelhada e quartzo hialino de média/grande dimensão. Rara muscovite, finíssima.
8 Quartzítico - TR - R medium/medium-AESPA-95-e16-i024.png Pasta algo compacta, de graõ médio/fino, com vácuos bem distribuídos, sub-angulosos. ENP em pouca quantidade e de pequena dimensão: ENP máficos negros, sem brilho; vácuos pseudo-mórficos; rara muscovite, finíssima. Algum quartzo hialino, sub-anguloso, de média dimensão, bem distribuído.
9 Quartzítico - TL - R medium/medium-AESPA-95-e16-i025.png Pasta de grão médio/fino, com vácuos bem distribuídos, sub-angulosos ou alongados, de pequena dimesão. ENP: quartzo hialino, subarredondado, de pequena/média dimensão, bem distribuído; bastante muscovite muito fina; rara calcite de pequena dimensão.
10 Quartzítico - TL - SemiRed medium/medium-AESPA-95-e16-i026.png Pasta de grão médio/fino, com vácuos de pequena dimensão, sub-angulosos ou alongados. ENP bem distribuídos, de pequena dimensão, sub-arredondados e raramente sub-angulosos: quartzo hialinmo e quartzo leitoso; raros vácuos pseudo-mórficos e feldspato.
11 Quartzítico - TR - SemiRed medium/medium-AESPA-95-e16-i027.png Pasta de grão médio/fino, com vácuos de pequena e média dimensão, alongados. ENP bem distribuídos, sub-angulosos, de pequena dimensão: quartzo hialino e leitoso. Escasso quartzo leitoso (e raro hialino) de média dimensão, bem distribuído.
12 Cerâmica cinzenta - TR - R medium/medium-AESPA-95-e16-i028.png Pasta pouco compacta, de grão médio, com bastante vácuos pequenos, sub-angulosos e raramente alongados. ENP bem distribuídos, de pequena dimensão: quartzo hialino, sub-anguloso, bem distribuido; escassa muscovite de ínfima dimensão; escassa biotite; alguns ENP máficos, negros, sem brilho.
13 Muscovítico - M - SemiRed medium/medium-AESPA-95-e16-i029.png Pasta de grão médio, com bastantes vácuos, sub-angulosos, de pequena e média dimensão. ENP de pequena dimensão, em boa quatidade, sub-angulosos: quartzo hialino. Bastante muscovite de pequena dimensão, visível à superfície, sobretudo. Biotite de média dimensão bem distribuída. Raro feldspato de média dimensão.
14 Quartzo-micácico - TL - SemiRed medium/medium-AESPA-95-e16-i030.png Pasta de grão médio, com alguns vácuos amorfos e alongados. ENP de pequena e média dimensão, sub-arredondados e sub-angulosos: quartzo hialino e sobretudo leitoso. Bastante muscovite de pequena dimensão, que não é vsível à superfície.
Tabela 7.  Mirobriga. Taberna 2 - fabricos de cerâmica comum. Largura real de cada foto: 11mm (elaboração do autor).

Esta última categoria de cozedura semi-redutora respeita a colorações de vermelho-acastanhado (Figs. 11 e 12, n.º 39 e 41), desconhecidas na cerâmica de Época Imperial, em Mirobriga. O nome é provisório, pretendendo essencialmente dar a ideia de uma cozedura oxidante muito mal obtida, num processo de cozedura em que a câmara do forno deveria estar apenas parcialmente aberta, possivelmente para manter a temperatura, o que não aconteceria num processo meramente oxidante. A leitura correcta do significado desta coloração só poderá ser obtida, obviamente, em futuras análises laboratoriais, mas a observação aponta para um estágio tecnológico claramente intermédio, com tendência a tonalidades mais escuras.

A cozedura semi-redutora surge em facies muscovítico, mas também quartzo-micácico e quartzítico; em torno lento, em manual, mas também em torno rápido (neste caso, quartzítico, aproximando-a mais da tradição romana).

A cozedura redutora surge em facies quartzítico (incluindo a cerâmica cinzenta); em torno lento e rápido.

A cozedura oxidante surge em facies caulinítico, moscovítico e sobretudo quartzítico; sobretudo em torno rápido, mas também em torno lento.

Na falta de estratigrafia com sedimentos acumulados respeitante ao século V pleno de Mirobriga (da Fase III, artesanal, que julgamos datar de momentos tardios dessa centúria, restam basicamente os elementos interfaciais), o momento mais próximo desse período desconhecido corresponde às amortizações das cavidades artesanais produzidas pela ocupação da Fase IVa, em 500-525 d. C. Esta, pelo menos no enchimento [1175] do forno [1174], embala ainda sedimentos do uso do forno, de coloração alaranjada, como discutimos supra. Neste enchimento [1174] (Fig. 3) encontramos já representados os fabricos 3a, 3b, 6, 8, 10 11 e 14, ou seja, o facies muscovítico, a par do quartzítico e do quartzo-micácico; a modelagem a torno lento, a par da de torno rápido; e a cozedura semi-redutora, a par da redutora.

A cozedura semi-redutora (fabricos 3b, 10, 11, 13 e 14) surge, por intrusão, na Fase I (70-100 d. C.), com um fragmento, estando já muito bem representada na Fase IV (500-525 d. C.), com 43 fragmentos (= 19,3 %); estabilizando-se na Fase VI (525+ d. C.), com 82 fragmentos (= 19,4 %). Cremos assim que a sua génese estará algures nas profundas transformações sociais, económicas, políticas e tecnológicas, experienciadas por cidades como Mirobriga, a partir do primeiro terço do século V d. C., época de abandono de várias estruturas públicas e privadas (Quaresma, 2012Quaresma, J. C. (2012). Economia antiga a partir de um centro de consumo lusitano. Terra sigillata e cerâmica africana de cozinha em Chãos Salgados (Mirobriga?). Estudos e Memórias, 4. Lisboa: UNIARQ.).

A mesma percepção temos para os fabricos de facies muscovítico (fabricos 3a, 3b, 6, 8, 10 11 e 14), desconhecido da cerâmica comum de Época Imperial, que totaliza 37 fragmentos (=16,7 %), na Fase IV (500-525 d. C.), diminuindo ligeiramente o seu peso na Fase VI (525+ d. C.), com 58 fragmentos (=13,7 %).

Se atentarmos na evolução percentual dos fabricos (Tab. 8), podemos exactamente constatar que se mantêm estáveis ao longo das Fases IV e VI, com três grandes excepções: o fabrico 6, quartzítico, de torno rápido e cozedura oxidante, desce de 57,4 para 42,8 %; enquanto os fabricos 9 e 10 passam de 4,9 para 13,2 % e de 6,3 para 13,7 %, respectivamente. Os fabricos 9 e 10 são igualmente de matriz quartzítica, mas ambos de torno lento; o primeiro, em cozedura redutora, e o segundo, semi-redutora. São um exemplo claro da perda de capacidade tecnológica, mas gradual, que se vive ao longo da primeira metade do século VI e já herdeira do século V, seguramente.

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Tabela 8.  Mirobriga. Taberna 2 - percentagens dos fabricos da cerâmica comum, em 500-525 d.C. (Fase IV) e 525+ d.C. (Fase VI) (elaboração do autor).
Fabrico Fase IV Fase VI
Frag. % Frag. %
TR 1 16 7,2 70 31 7,3 55,6
2 1 0,4 5 1,2
4 1 0,4 10 2,4
5 5 2,2 0 0
6 128 57,4 181 42,8
8 2 0,9 2 0,5
11 2 0,9 1 0,2
12 1 0,4 5 1,2
TL 3 29 13 29,1 47 11,1 44,2
7 10 4,5 21 5
9 11 4,9 56 13,2
10 14 6,3 58 13,7
14 1 0,4 5 1,2
M 13 2 0,9 0,9 1 0,2 0,2
Total 223 100 100 423 100 100
Tabela 9.  Mirobriga. Taberna 2 - evolução das técnicas de modelagem da cerâmica comum, em 500-525 d.C. (Fase IV) e 525+ d.C. (Fase VI) (elaboração do autor).
Fabrico Fase IV Fase VI
Frag. % Frag. %
Ox 1 16 7,2 72,5 31 7,3 62,2
2 1 0,4 5 1,2
3c 1 0,4 15 3,5
4 1 0,4 10 2,4
5 5 2,2 0 0
6 128 57,4 181 42,8
7 10 4,5 21 5
SR 3b 24 10,8 19,3 17 4 19,3
10 14 6,3 58 13,7
11 2 0,9 1 0,2
13 2 0,9 1 0,2
14 1 0,4 5 1,2
R 3a 4 1,8 8 15 3,5 18,4
8 2 0,9 2 0,5
9 11 4,9 56 13,2
12 1 0,4 5 1,2
Total 223 100 100 423 100 100
Tabela 10.  Mirobriga. Taberna 2 - evolução das técnicas de cozedura da cerâmica comum, em 500-525 d.C. (Fase IV) e 525+ d.C. (Fase VI) (elaboração do autor).

Na Fig. 16, podemos comparar a evolução das técnicas de modelagem. Na Fase IV, o torno rápido representa ainda mais de dois terços (70 %), enquanto que o torno lento representa menos de um terço (29 %) e a modelagem manual é rara (0,9 %). Na Fase VI, a modelagem manual (ver Fig. 22, n.º 41, da Fase VII) mantém o mesmo valor, mas o torno lento, com 44 %, aproxima-se um pouco do torno rápido, com 56 % do total.

Na Fig. 17, podemos comparar a evolução das técnicas de cozedura. Na Fase IV, a cozedura oxidante representa mais de dois terços (73 %), enquanto que a semi-redutora representa cerca de um quinto (19 %), e a redutora apenas 85 do total. Na fase VI, a cozedura semi-redutora mantém-se nos 19 %, enquanto que a cozedura redutora, que cresce para 18 %, se aproxima um pouco da oxidante, que decai para 62 % do total.

No que respeita às técnicas de acabamento das superfícies, as Fases IV e VI revelam uma constância quase total:

  • na Fase IV, o alisamento representa 86,5 % do total de 223 fragmentos, enquanto o polimento representa 12,1% e a aguada 1,3 %;

  • na Fase VI, o alisamento representa 84,9 % do total de 423 fragmentos, enquanto o polimento representa 13,7 % e a aguada 0,7 %; a única novidade, embora incipiente, é a do brunido, com 0,7 %.

Num último apontamento arqueométrico, o conjunto da taberna 2 revela também diferenças claras de opção tecnológica, aquando da confecção de panelas e tachos. As panelas, vocacionadas para a cozedura de alimentos e mais relacionadas com o gado vacum, distribuem-se por uma enorme variedade de fabricos (1, 2, 3, 4, 6, 7, 9, 10, 13 e 14), encontrando-se assim em todos os facies: caulinítico, quartzítico, quartzo-micácico e moscovítico. Também na modelagem se distribuem pelas 3 variantes: torno rápido, torno lento e manual. Os tachos, se bem que muito menos representados, encontram-se distribuídos pelos fabricos 1, 4, 6a, 6b e 8, nos facies quarzítico, caulinítico e muscovítico. Contudo, todos os fabricos de tachos são de torno rápido, denotando um maior cuidado de acabamento. Com menos ENP e mais argila (sendo os minerais de argila, filo-silicatos, de configuração plana e assim refractários) na sua constituição, requerem mais trabalho ao oleiro para se alcançar a funcionalidade desejada (Velde e Druc, 1999Velde, B. e Druc, I. C. (1999). Archaeological ceramic materials. Origin and utilisation. Heidelberg: Springer.). Essa funcionalidade, mais relacionada com a confecção de estufados e com o gado ovi-caprino (Arthur, 2007Arthur, P. (2007). “Pots and boundaries. On cultural and economic areas between Late Antiquity and the Early Middle Ages”. In: Bonifay, M. e Tréglia, J.-M. (Eds.). LRCW 2. Late Roman Coarse Wares, Cooking Wares and Amphorae in the Mediterranean. Archaeology and Archaeometry, BAR-IS, 1662 (I). Oxford: Archaeopress, pp. 15-27.), requere pastas cerâmicas melhor batidas e alisadas, que provoquem alguma refracção do calor emitido pelo lume e uma consequente preparação mais lenta dos alimentos; pelo contrário, as panelas, onde encontramos muito facilmente ENP grosseiros (multifacetados e assim difusores do calor) em boa quantidade, e até visíveis à superfície, precisam de uma temperatura mais alta e difusa, que uma pasta mais rica em ENP grosseiros proporciona. Ou seja, a falta de qualidade técnica de muitas panelas tardo-antigas não é apenas resultados de menores capacidades dos oleiros, mas também um acto intencional para se obter maior eficácia no seu uso quotidiano - que até se alcança assim com menos esforço no seu fabrico.

5. CATÁLOGO

 

CC = Cerâmica comum. L/R = Local ou regional

  1. Mir-21-[1175]-24 - CC - L/R - Fabrico 3b - Cossoiro.

  2. Mir-21-[1175]-17 - CC - L/R - Fabrico 6a - Pote de bordo em S.

  3. Mir-21-[1175]-6+7+8+9+10+11+12+13+14 - CC - L/R - Fabrico 10 - Pote.

  4. Mir-21-[1175]-15+16 - CC - L/R - Fabrico 11 - Pote de bordo em S.

  5. Mir-21-[1175]-1+2 - CC - L/R - Fabrico 3b - Pote de bordo vertical. Decoração em banda incisa.

  6. Mir-21-[1175]-3+4+5 - CC - L/R - Fabrico 3b - Pote de bordo vertical. Decoração em banda incisa.

  7. Mir-19-[1102]-14 - CC - L/R - Fabrico 1 - Prato covo.

  8. Mir-19-[1102]-5 - CC - L/R - Fabrico 6a - Tacho.

  9. Mir-19-[1102]-10 - CC - L/R - Fabrico 6a - Pote de bordo espessado.

  10. Mir-19-[1102]-9+54+55 - CC - L/R - Fabrico 6a - Pote de bordo amendoado.

  11. Mir-19-[1095]-3 - Ânfora - Lusitania, Tejo/Sado, Almagro 51c.

  12. Mir-19-[1095]-?+?+?+? - CC - L/R - Fabrico 9 - Panela de bordo vertical.

  13. Mir-19-[1095]-4 - CC - L/R - Fabrico 3a - Panela de bordo em S.

  14. Mir-17-[1068]-27 - Vidro - Incolor esverdeado - Isings 116 / Taça campanulada baixa.

  15. Mir-19-[1068]-92 - CC - L/R - Fabrico 3a - Dolium.

  16. Mir-18-[1068]-208 - CC - L/R - Fabrico 6a - Panela de bordo amendoado.

  17. Mir-19-[1068]-95 - CC - L/R - Fabrico 1 - Panela de bordo amendoado.

  18. Mir-18-[1068]-4 - CC - L/R - Fabrico 4 - Panela de bordo vertical.

  19. Mir-18-[1068]-6+11+53+65+72+103 - CC - L/R - Fabrico 1 - Tacho.

  20. Mir-18-[1068]-58 - CC - L/R - Fabrico 6b - Panela de bordo amendoado.

  21. Mir-18-[1068]-12 - CC - L/R - Fabrico 13 - Panela de bordo em S.

  22. Mir-18-[1048]-1+233+258 - CC - L/R - Fabrico 3a - Panela de bordo em S.

  23. Mir-18-[1048]-167+174+? - CC - L/R - Fabrico 9 - Panela de bordo em S.

  24. Mir-18-[1046]-2 - CC - L/R - Fabrico 6a - Panela de bordo amendoado.

  25. Mir-17-[1017]-186 - Terra sigillata africana C/E - Hayes 58A.

  26. Mir-17-[1017]-32 - Vidro - Incolor esverdeado - Isings 116 / Taça campanulada baixa.

  27. Mir-18-[1017]-479 - CC - L/R - Fabrico 1 - Potinho.

  28. Mir-18-[1017]-371- CC - L/R - Fabrico 1 - Tampa. Decoração penteada.

  29. Mir-17-[1017]-13 - CC - L/R - Fabrico 6a - Pote de bordo amendoado.

  30. Mir-18-[1017]-414 - CC - L/R - Fabrico 6a - Pote de bordo amendoado.

  31. Mir-17-[1017]-281 - CC - L/R - Fabrico 6c - Pote de bordo espessado.

  32. Mir-17-[1017]-210- CC - L/R - Fabrico 6b - Tacho.

  33. Mir-18-[1017]-410 - CC - L/R - Fabrico 3a - Panela de bordo em S.

  34. Mir-17-[1017]-79 - CC - L/R - Fabrico 2 - Tigela.

  35. Mir-18-[1017]-547 - CC - L/R - Fabrico 14 - Panela de bordo em S.

  36. Mir-17-[1017]-82 - CC - L/R - Fabrico 7 - Panela de bordo em S.

  37. Mir-17-[1007]-17 - CC - L/R - Fabrico 11 - Prato covo / Frigideira.

  38. Mir-17-[1006]-68 - CC - L/R - Fabrico 7 - Pote de bordo amendoado.

  39. Mir-16-[1006]-4 - CC - L/R - Fabrico 10 - Polimento - Ind..

  40. Mir-16-[1003]-26 - CC - L/R - Fabrico 8 - Tacho.

  41. Mir-17-[1010]-11 - CC - L/R - Fabrico 13 - Panela. Marcas internas de fabrico manual.

6. EM GUISA DE CONCLUSÃO

 

Em breves linhas, a escavação da taberna 2 de Mirobriga permitiu alguns avanços no conhecimento urbanístico, arquitectónico, funcional, ceramológico e cronológico do sítio.

Confirma-se a fundação flávia do edifício B, que integra as tabernae 1 e 2; mas permanece incógnita a perduração destas lojas enquanto tal. O palimpsesto estratigráfico que as ocupações tardo-antigas provocaram em ambos os compartimentos obliterou totalmente a evidência dos solos de ocupação/desocupação de época imperial. Para além dos materiais cerâmicos ou vítreos reembalados nas unidades posteriores, da ocupação imperial apenas temos dados, prováveis, através dos buracos de poste da Fase II da taberna 2.

É assim igualmente impossível datar o fim da funcionalidade comercial destes compartimentos, embora o alçado conservado permite sugerir que tenham sido bem conservados ao longo do tempo, até porque, no caso da taberna 2, foi possível atestar o colapso do telhado cerâmico, numa cronologia já muito tardia de c. 525 d. C. Para já, pouco mais é possível do que supor que, por volta das primeiras décadas do século V d. C., ou talvez até antes, essa função se tenha perdido e talvez mesmo tenha ocorrido um período de desocupação do espaço.

O primeiro palimpsesto do espaço ocorre possivelmente num século V pleno, através da instalação de uma oficina metalúrgica, de arquitectura simples, realizada através de fossas e buracos de poste na rocha-mãe, com um forno do tipo bassuofuoco a pozzetto, muito provavelmente destinado à reciclagem de utensílios metálicos e a alguma fundição de cobre. Com o telhado cerâmico ainda em uso no edifício, é possível que parte não estivesse em condições, permitindo a evacuação dos fumos. A singeleza destas estruturas leva a tender à exclusão da fundição de ferro; a pouca rubefacção das paredes do forno e do seu sedimento interno indica, por seu lado, que esta actividade não deve ter durado muito tempo e se aproxime cronologicamente dos finais do século V d. C., já que esta fase estratigráfica é amortizada directamente pela ocupação de 500-525 d. C.

O espaço recebe na Fase IV (500-525 d. C.) uma funcionalidade doméstica, ainda usufruindo do telhado cerâmico que só irá ruir num breve momento de desocupação em torno a 525 d. C. (Fase V). A fase que se lhe segue de imediato (Fase VI) apresenta finalmente dados incontornáveis relativos a uma função habitacional. Apesar de já não existir telhado cerâmico, mas sim outro, provavelmente em material perecível, sustentado no topo das paredes, a escavação demonstrou a existência de lareira e de níveis de circulação associados.

A datação destas fases domésticas visigóticas levanta problemas, em face da ausência de materiais finos, com excepção do vidro Isings 116 / Taça campanulada baixa, cuja baliza temporal encaixa em c.450-550 d. C. (Cruz, 2009Cruz, M. (2009). O Vidro Romano no Noroeste Peninsular. Um olhar a partir de Bracara Augusta. Tese de doutoramento. Universidade de Minho.). Novamente, o estudo da cerâmica comum local ou regional foi essencial.

A Fase IV possui cerca de 70 % de torno rápido, contra cerca de 30 % de torno lento (sendo a modelagem manual episódica), o que aproxima esta estatística da da observada na área de Madrid (Vigil-Escalera, 2007Vigil-Escalera Guirado, A. (2007). “Algunas observaciones sobre las cerámicas “de época visigoda” (ss. V-IX d.C.) de la región de Madrid”. In: Malpica, A. e Carvajal López, J. C. (Eds.). Estudios de cerámica tardorromana y altomedieval. Primer taller sobre la cerámica tardorromana. Universidad de Granada. March 2005. Granada: Alhulia, pp. 357-382.) e em Lisboa - sector das Escadinhas de São Crispim (Quaresma, 2020Quaresma, J. C. (2020). “Late contexts from Olisipo (Lisbon, Portugal): Escadinhas de São Crispim”. In: Duggan, M., Turner, S. e Jackson, M. (Eds.). Ceramics and Atlantic Connections: Late Roman and early medieval imported pottery on the Atlantic Seaboard. International symposium. New Castle University, March 26-27th 2014. Roman and Late Antique Mediterranean Pottery, 15. Oxford: Archaeopress, pp. 94-107.). Já a Fase VI, com uma relação torno rápido / torno lento de cerca de 55-45 %, não atinge a equiparação que parece ocorrer na área de Madrid, ou mesmo o domínio do torno lento que se observa em Lisboa-Escadinhas de São Crispim, em 525-550 d. C. Por isso, adoptámos uma datação conservadora de 525+ d. C. para esta Fase VI, não excluindo a hipótese de se estender por este quartel da sexta centúria, quando Lisboa ainda possui episódica cerâmica manual - o que se observa igualmente em Mirobriga. Mais ainda, uma cronologia de terceiro quartel do século VI parece muito improvável, por comparação com o contexto de 550/575+ d. C. de Lisboa-Palácio dos Condes de Penafiel, onde o torno rápido já só representa 11 %, o torno lento 75 % e a cerâmica manual já está finalmente consolidada com 14 % (Quaresma e Silva, no preloQuaresma, J. C. e Silva, R. B. (no prelo). “Olisipo-Lisbon (sector Palácio dos Condes de Penafiel): a very important context from AD c. 550-575: fine wares, amphorae, glasses, coarse ware”. In: Colóquio Internacional SECAH. Cerâmica Antiga na Hispania (séculos II a VII d.C.). Contextos estratigráficos entre o Atlântico e o Mediterrâneo. Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa). 7-9 de Maio de 2020.). Aliás, essa mesma consolidação da cerâmica manual é observada na área de Madrid (Vigil-Escalera, 2003, gráf. 3Vigil-Escalera Guirado, A. (2003) “Cerámicas tardorromanas y altomedievales de Madrid”. In: Caballero, L., Mateos, P. e Retuerce, M. (Eds.). Cerámicas tardorromanas y altomedievales en la península Ibérica. Ruptura y continuidad (II Simposio de arqueología. Mérida 2001). Anejos de Archivo español de Arqueología XXVIII. Madrid, pp. 371-388.).

Já a percentagem de cozedura redutora da Fase VI, inferior a 50 % parece ir de encontro à dos níveis de 525-550 d. C. do sector Travessa de João Galo, n.º. 4-4B, em Setúbal (Silva e Coelho-Soares, 2014Silva, C. T. e Coelho-Soares, A. (2014). “Preexistências de Setúbal. A ocupação da Época Romana da Travessa de João Galo, n.º 4-4B”. In: II Encontro de Arqueologia da Arrábida. Homenagem a A.I. Marques da Costa. Setúbal Arqueológica 15. Setúbal: MAEDS, pp. 305-338.).

Pouco a pouco vamos assim conhecendo algumas das posições urbanas das gentes que ainda ocupavam a antiga cidade, em época visigótica, quando sabemos que vários sectores públicos e privados da cidade já estavam desactivados desde os séculos III e IV (Quaresma, 2012Quaresma, J. C. (2012). Economia antiga a partir de um centro de consumo lusitano. Terra sigillata e cerâmica africana de cozinha em Chãos Salgados (Mirobriga?). Estudos e Memórias, 4. Lisboa: UNIARQ.; Teichner, 2018Teichner, F. (Ed.) (2108). Mirobriga. Eine Stadt im fernen Westen des Imperium Romanum. Kleine Schriften aus dem Vorgeschlichten Seminar Marburg 62. Marburg: Universität Marburg.; Sousa, 2018Sousa, F. (2018). A Casa da Calçada, Mirobriga. Diacronia de um Edifício Habitacional de Época Romana (Séculos I a IV d.C.). Dissertação de Mestrado em Arqueologia entregue à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Universidade Nova de Lisboa.), embora os gráficos de importação de terra sigillata (Quaresma, 2012Quaresma, J. C. (2012). Economia antiga a partir de um centro de consumo lusitano. Terra sigillata e cerâmica africana de cozinha em Chãos Salgados (Mirobriga?). Estudos e Memórias, 4. Lisboa: UNIARQ.) ou o comércio anfórico (nomeadamente a ânfora africana Keay 62: Diogo, 1999Diogo, A. M. D. (1999). “Ânforas romanas de Miróbriga”. Arquivo de Beja, 10, pp. 15-27.) comprovassem já uma importante continuidade demográfica até ao primeiro terço do século V e alguma continuidade de ocupação do sítio até ao primeiro quartel do século VI d. C. (terra sigillata foceense tardia, tipo Hayes 3H: Quaresma, 2012Quaresma, J. C. (2012). Economia antiga a partir de um centro de consumo lusitano. Terra sigillata e cerâmica africana de cozinha em Chãos Salgados (Mirobriga?). Estudos e Memórias, 4. Lisboa: UNIARQ.).

NOTA

 
1

Colocando este trabalho no campo da Arqueologia da Produção tardo-antiga, um campo iniciado há muito por R. Francovich (apudLa Salvia, 2016La Salvia, V. (2016). “Impianti metallurgico tardo antichi ed alto medievali a Roma. Alcune reflessioni technologiche e storico-economiche a partire dai ricenti rinvenimenti archeologici a Piazza della Madonna di Loreto”. In: Molinari, A., Valenzani, R. S. e Spera, L. (Eds.). L’Archeologia della produzione a Roma (secoli V-XV). Atti del Convegno Internazionale di Studi. Roma, 27-29 marzo 2014. Collection de l’École Française à Rome, 516, pp. 253-278.). Ver teorização mais recente em Giannicheda (2014)Giannichedda, E. (2014). “Archeologia della produzione”. Archeologia Medievale, n.º speciale, pp. 75-94. e em Duckworth e Wilson (2020)Duckworth, Ch. e Wilson, A. (2020). “Introduction. Recycling and reuse in the Roman economy”. In: Duckworth, Ch. e Wilson, A. (Eds.). Recycling and reuse in the Roman economy. Oxford: Oxford University Press, pp. 1-8..

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